Mesmo em caso de apuração de suposto crime por meio de disque denúncia, policiais militares não podem adentrar domicílio sem informar os direitos dos moradores — em especial a garantia de não autorizar a entrada. Caso esse rito não seja observado, a ação policial é ilegal e nula, mesmo que tenha havido concordância tácita dos que habitavam a moradia.
Sob esse entendimento, a juíza Luciana Piovesan, da 27ª Vara Criminal de São Paulo, absolveu quatro homens acusados de tráfico de drogas, atendendo a pedidos da defesa e do próprio Ministério Público, que considerou inválida a ação repressora dos agentes.
Nos autos, consta que a polícia foi acionada por meio de disque denúncia para apurar suposto crime de tráfico de drogas. Na ligação, foi dito um endereço específico e um nome para averiguação. Chegando no local, os policiais perceberam que se tratava de uma série de casas em um mesmo terreno. O dono das casas afirmou que a moradia citada na denúncia estava alugada.
Chegando neste local, os policiais não facultaram aos moradores a decisão para entrada em domicílio.
"O proprietário lhes abriu o cadeado do portão único que dava acesso ao quintal onde havia as casas. Ele disse que um parente morava em uma das casas e que a outra tinha sido alugada para rapaz que não identificou, não apresentando qualquer documento sobre a locação. Esse proprietário não foi qualificado ou levado à delegacia", descreve a juíza no processo.
"[Os policiais] disseram a M. o que estavam fazendo ali e logo viram os demais acusados. Todos ficaram quietos. Não falaram que M. não precisava deixar que entrassem. M. franqueou a entrada e K., que estava mais perto do segundo cômodo, logo disse que havia drogas no local."
Para a juíza, "não se tem informações seguras de como teriam os policiais entrado no terreno onde instalada a malfadada casa nº 02, onde estavam os réus, e tampouco se respeitadas as prescrições legais e constitucionais para ingresso na tal própria casa".
Além de não respeitar os trâmites legais, os agentes também não arrolaram o dono da casa e o vizinho que supostamente teriam ajudado a encontrar os réus. Ou seja, em termos processuais não há qualquer prova ou referência a como os policiais entraram no imóvel.
"O cenário, pois, não fez legitimada a ação policial, não emprestando licitude à busca realizada para apreensão de instrumentos do crime previsto no artigo 33 da Lei 11.343/06. Reputa-se, daí, nula a prova, o que traz como consequência a absolvição. Nesse sentido os inúmeros e recorrentes julgados do E. Superior Tribunal de Justiça, não cabendo a este juízo simplesmente ignorar a jurisprudência atual e decidir de forma contrária ao caminho trilhado pelas instâncias superiores", sentenciou a julgadora.
Os réus foram defendidos pelos advogados Evandro Henrique Gomes e Paulo Evângelos Loukantopoulos.