Tocar a vida por conta própria é um sonho recorrente, mas de realização custosa. Todos que decidem bancar esta aventura vão enfrentar a inevitável Seleção Natural, esta megera que vai eliminando dia a dia os menos preparados, os pouco dedicados, os ineptos, e, por injusto que pareça, os sem sorte.
Aqueles que aprenderem a “mexer com gente”, a transformar o dinheiro em servo, a lidar com a concorrência, a trabalhar duro, a administrar a agonia e a vencer o stress, têm chance de sucesso.
Mesmo esses podem precisar de várias tentativas para escapar da predadora voraz que come as empresas sem piedade. Muitos terão que mudar de ramo, de cidade, de estado ou de país, até se firmarem.
Um ou outro será bafejado pela serendipidade, que é um termo derivado de um conto de fadas “Os Três Príncipes de Serendip”, em que os protagonistas estavam sempre fazendo descobertas por acidente ou sagacidade, de coisas que não estavam procurando.
Os negócios estão cheios de serendipidade. Muitos deles desviam para algo que não estava no projeto inicial e alcançam sucesso.
Entretanto é muito bom ter os pés no chão. Nada adianta criar planos mirabolantes de comprar um jatinho ou um iate. Ninguém precisa ser um herói pra ser feliz.
O bom é sonhar o “sonho possível”, almejar a façanha realizável, livrar-se do mau humor, da prepotência, da arrogância. Tratar todos à sua volta com respeito e cordialidade.
Alegrar-se com cada conquista, comemorar cada sucesso, ainda que modesto. Porque não há uma grande chegada, mas sim obstáculos vencidos, metas alcançadas, que de acordo com a expectativa de cada um, podem se transformar em grandes alegrias.
O que conta é a expectativa. Se são razoáveis e alcançáveis elas vão dando prazer ao longo da vida. Se mirabolantes tem efeito contrário: trazem frustrações e tristezas.
Permitam-me um exemplo pessoal: comecei a trabalhar como auxiliar de escritório de uma empresa algodoeira. Aquele emprego humilde que pagava salário mínimo, atendia a expectativa de um garoto pobre e eu me sentia realizado e feliz.
Cinco anos depois entrei no Banco do Brasil, lá durante 15 anos trabalhei com satisfação. De novo aquele trabalho atendia minhas expectativas da época e continuava me sentindo realizado e feliz.
Deixei o Banco para tentar a vida como empresário. Não foi fácil deixar um emprego super seguro para enfrentar as incertezas dos negócios.
Hoje, por conta de um talento raquítico, de alguma preparação, razoável dedicação, boa disposição e enorme sorte consegui me firmar como empresário.
Continuo me sentido realizado e feliz. Mas não sou mais realizado e feliz agora, cinquenta e tantos anos depois daquele primeiro emprego. Nem menos.
O que eu quero dizer com isso é que o importante é não vincular a curtição de uma conquista para o próximo objetivo. O ideal é levá-la junto durante o trajeto, alegrando com cada obstáculo superado.
Além disso é bom desenvolver a consciência da sensação de realização e felicidade, para que um dia não venha a reproduzir a frase conhecida “era feliz e não sabia.”
Porque o que conta, na verdade, é a caminhada. Chegar a gente nunca chega mesmo.
A “sorte” precisa de ajuda pra desabrochar. Ajude-a.
Adaptado do meu livro Virando Patrão
Editora Juruá – Curitiba.