O Ministério dos Povos Indígenas publicou uma portaria restringindo o acesso à Terra Indígena Piripkura, aldeia isolada no norte de Mato Grosso. A área tinha uma medida de restrição, mas que estava vencida há um ano. A medida foi publicada em diário oficial nesta sexta-feira (10).
A Terra Indígena Piripkura é habitada por Tamandua e Baita, dois indígenas em isolamento voluntário que sobreviveram a sucessivos massacres contra seu povo nas décadas passadas. Eles são supostamente os dois últimos membros do povo Piripkura, considerada em extinção. Por causa disso, o território é definido por essa portaria de restrição de uso.
Em março de 2022, o prazo da portaria que dava proteção legal à Terra havia vencido. O Ministério Público Federal (MPF) aguardava resposta da Justiça Federal sobre a renovação da medida, pois, o fim da proteção abriria brecha para que a área fosse leiloada como fazenda.
Conforme a portaria, fica proibida o ingresso, locomoção e permanência de pessoas estranhas aos quadros da Funai, bem como a proibição de exploração de qualquer recurso natural existente na área.
"Somente poderão ingressar, locomover e permanecer na área por tempo determinado, pessoas autorizadas pela coordenação geral de índios isolados de recente contato […] também é vedada a exploração de qualquer recurso natural existente na área descrita nesta portaria, durante a respectiva vigência", diz trecho do documento.
Ainda de acordo com o documento, a "restrição estabelecida não se aplica às forças armadas e policiais, no cumprimento de suas funções institucionais, cujo ingresso, locomoção e permanência na área descrita, deverá ser sempre acompanhada por funcionários da Funai".
Extração de madeiras
A ministra dos Povos Indígenas, Sonia Guajajara, anunciou em uma rede social que foi revogada a medida da gestão Bolsonaro que liberou a extração de madeira em terras indígenas, inclusive por não indígenas. A declaração foi feita em 16 de janeiro de 2023.
A revogação foi feita pela Funai, subordinada ao ministério, e publicada no "Diário Oficial da União", no dia 17 de janeiro de 2023.
Invasões e ocupação ilegal
Em isolamento voluntário, os indígenas Piripkura fazem parte de um subgrupo Kawahiva que ocupa os municípios mato-grossenses de Colniza e Rondolândia, distantes 1.065 e 1,6 mil km de Cuiabá, respectivamente.
Ao menos nove pessoas foram identificadas e citadas na Ação Civil Pública de Reintegração de Posse proposta pelo MPF, por meio do Ofício de Populações Indígenas e Comunidades Tradicionais em Mato Grosso, por ocupação ilegal de parte da Terra Indígena Piripkura.
De acordo com o MPF, a invasão da TI —e consequente degradação ambiental— ocorre pelo menos desde 2008, quando alguns dos citados foram autuados por desmatamento ilegal e outros crimes ambientais, como caça de animais silvestres.
As invasões do território e os atos de degradação ambiental tornaram-se mais intervalados desde 2015, sendo que a última e mais atual invasão teve início em 2019.
Conforme o procurador da República, titular do Ofício de Populações Indígenas e Comunidades Tradicionais, Ricardo Pael Ardenghi, as invasões no referido território indígena foram sensivelmente impulsionadas pela redução das ações de fiscalização ao longo do ano de 2020, devido a pandemia de Covid-19.
Funai, Ibama e ministérios
Antes de a ministra comunicar a revogação, a Fundação Nacional do Índio (Funai), rebatizada de Fundação Nacional dos Povos Indígenas, havia dito que já estava em contato com o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) para "determinar providências" a respeito da instrução normativa.
Na nova composição ministerial do governo Luiz Inácio Lula da Silva – Lula, a fundação passou a fazer parte da estrutura do até então inédito Ministério dos Povos Indígenas.
"Cabe destacar que a Instrução Normativa não foi objeto de consulta aos povos indígenas como previsto nos dispositivos legais existentes, logo, é natural que tenha seus efeitos suspensos até uma análise mais aprofundada e seja objeto de consulta", diz nota da Funai.
A reportagem também tinha procurado o Ibama, que é vinculado ao Ministério do Meio Ambiente, e o próprio ministério.