O último relatório feito pelo então interventor da Saúde de Cuiabá, Hugo Fellipe Lima, e encaminhado ao desembargador Orlando Perri, na noite dessa quinta-feira (5), aponta que o município acumula contas de água e energia das Unidades Básicas de Saúde atrasadas, contratações irregulares e desnecessárias que inflaram a folha de pagamento, além de baixa produtividade e qualidade nos serviços prestados à população da capital.
Nesta sexta-feira (6), a presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Maria Thereza de Assis Moura, acolheu um recurso da Prefeitura de Cuiabá para reverter a intervenção do governo na Secretaria Municipal de Saúde. Com isso, o município volta a assumir a gestão da pasta e as mudanças feitas pelo interventor à Justiça ficam suspensas.
A prefeitura afirma que as alegações feitas pelo interventor nos autos não procedem e que o município “mantém uma gestão colaborativa e com observância às medidas elencadas em decisão judicial”.
Conforme o relatório encaminhado à Justiça, as contas de água e luz das unidades de saúde não são pagas desde setembro do ano passado. Somente os gastos de energia atrasados passam de R$ 1 milhão.
“A atual situação é tão tenebrosa, que o órgão não vem honrando com suas despesas essenciais, como tarifas de água e energia, correndo o risco da interrupção dos serviços a qualquer momento, além de onerar os cofres públicos com os juros e multas devidos”, diz trecho do documento.
Quanto ao custo mensal da Secretaria Municipal de Saúde, o gabinete de intervenção informou que fez um levantamento com pacotes de despesas e a média mensal ficou em torno de R$ 120 milhões. O montante representa o valor mensal necessário para manter o funcionamento das unidades de saúde.
Ainda estão sendo levantados custos específicos da Empresa Cuiabana de Saúde Pública, responsável pela administração do Hospital Municipal de Cuiabá (HMC) e Hospital São Benedito (HSB). No entanto, a dívida atual da empresa, conforme o levantamento, é de R$ 160 milhões, referentes a pagamentos de fornecedores e prestadoras de serviço médico.
“Os efeitos da desorganização e falta de gestão na Secretaria Municipal de Saúde de Cuiabá podem ser vistos na baixa qualidade dos serviços ofertados pelo órgão, fornecedores interrompendo a prestação de serviços, medicamentos e materiais em falta nas unidades de atendimento, prejudicando o usuário do SUS”, ressalta.
Na petição, Hugo Fellipe pediu a intimação da prefeitura para que disponibilize os valores de recursos oriundos dos governos estadual e federal e, no mínimo, a diferença necessária para totalizar R$ 120 milhões até o dia 10 de cada mês, valor mínimo e necessário, segundo ele, para arcar com os custos mensais da Saúde do município.
Também havia sido solicitado a concessão de ordem de busca e apreensão do backup de dados da Secretaria Municipal de Saúde para liberação imediata do acesso às informações da pasta.
Em 2021, Emanuel Pinheiro chegou a ser afastado durante a Operação Capistrum, que investigou um “cabide de empregos” – excesso de contratações de servidores – na prefeitura para acomodar indicações de aliados, além de obter, manter ou pagar apoio político.
Consequências para os pacientes
Atualmente, segundo o interventor, Cuiabá permanece com uma cobertura de 63,76% de atenção básica e um déficit de 35 médicos de saúde da família e três médicos da equipe de consultório de rua. Considerando que cada profissional é responsável pelo cuidado de, em média, 4,5 mil pacientes, há 157,5 mil moradores desassistidos.
O relatório aponta ainda que todas as Unidades Básicas de Saúde enfrentam falta de medicações de uso contínuo para tratamento de doenças crônicas, como diabete, hipertensão, além da falta de insumos para realização de curativos dos mais simples aos mais complexos, falta de equipe para administração de medicamentos endovenosos, dentre outros.
Conforme o levantamento, não há sequer soro fisiológico para realização de cuidados básicos, como lavagem oftalmológica, otológica, curativos, e infusões venosas para tratamento de urgências na atenção primária.
Em uma análise prévia, também foi constado inúmeros profissionais de enfermagem, lotados nessas unidades de forma irregular e desnecessária, inflando a folha de pagamento.
No Pronto Socorro Municipal, verificou-se que há 207 leitos cadastrados no Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde (CNES), sendo 40 leitos de UTI Adulto, três de UTI Neonatal, cinco de UTI Pediátrica, quatro de unidades de isolamento e 47 leitos cirúrgicos. No entanto, o hospital não tem disponibilizado todos os leitos e nem as especialidades.
“Em síntese, é importante esclarecer que o hospital, com toda a estrutura hospitalar que tem, com a capacidade instalada de 207 leitos, está com leitos ociosos, baixa produtividade e custo muito elevado”, diz outro trecho da petição.
Rombo
O primeiro levantamento apresentado pelo Gabinete de Intervenção apontou um rombo de R$ 356 milhões na pasta e apenas R$ 5,6 milhões em caixa para arcar com as dívidas mais urgentes.
Em nota, a prefeitura informou que os números foram apresentados de forma indiscriminada, sem apontamentos detalhados e que, em breve, será divulgado um levantamento criterioso sobre os restos a pagar.