O juiz Wladymir Perri, da 12ª Vara Criminal de Cuiabá, desclassificou o crime de homicídio doloso imputado à médica Letícia Bortolini, que escapou de ir a júri popular pelo atropelamento que vitimou o verdureiro Francisco Lúcio Maio.
A decisão é desta quinta-feira (24) e atendeu ao recurso da defesa da médica.
Logo no início da decisão, o magistrado afirmou que não há dúvidas sobre a materialidade e que os elementos de prova demonstram que a médica atropelou o verdureiro.
Por outro lado, entendeu ser necessário fazer juízo de retratação para afastar o dolo da conduta atribuída à ré.
Sobre o estado de embriaguez que a acusada estaria no momento do acidente, conforme o juiz, não há provas de que Bortolini contundentes dessa circunstância apontada na denúncia.
Perri citou que um médico legista atestou que os sinais vitais da acusada eram normais e refutou o testemunho de um policial militar, após ver divergências nos depoimentos prestados por ele.
“Assim, analisando todo o conjunto de elementos que compõem o acervo probatório, ENTENDO NÃO HAVER PROVAS HÁBEIS AO RECONHECIMENTO DA ALTERAÇÃO DA CAPACIDADE PSICOMOTORA DA ACUSADA PELA INGESTÃO DE BEBIDA ALCOÓLICA, de modo que a tese da acusação, nesse aspecto, se classificaria como pouco provável, não ensejando sua admissão em sede de pronúncia”.
Em relação ao excesso de velocidade, o juiz averiguou que os laudos produzidos nos autos acabaram sendo anulados e que o documento adotado como referência de valores, nunca foi juntado no processo.
“Em sendo assim, mesmo que a acusada tenha imprimido velocidade acima daquela regulamentar, não excedendo mais de 50 ( Cinquenta ) quilômetros por hora a velocidade da via, não visualizo a mínima probabilidade de ter havido excesso extraordinário, a indicar ter ela assumido o risco do resultado danoso”, completou.
Ainda na decisão, ele rebateu a acusação, de que o fato de a acusada não ter parado para prestar socorro à vítima, teria assumido o resultado de morte.
“Ademais, há severas dúvidas se a acusada Letícia Bortolini teria deixado voluntariamente de parar o veículo e prestar socorro ou apenas não teria percebido ter atropelado a vítima”.
“Portanto, analisando as provas produzidas no inquérito policial e em juízo, compreendo não haver circunstâncias anormais que, minimamente, indiquem a hipótese da acusada ter assumido o risco de produzir o resultado danoso, não ultrapassando o fato, APESAR DE TRÁGICO, à ordinária hipótese de delito culposo”, concluiu o magistrado.
Com a desclassificação, o caso será remetido para um juízo competente.
O caso
O acidente que matou o verdureiro Francisco Lucio Maia ocorreu no dia 14 de abril de 2018, em Cuiabá.
A médica chegou a ser presa, mas ficou três dias encarcerada, quando o desembargador Orlando Perri, do Tribunal de Justiça de Mato Grosso, revogou a prisão.
Ao apresentar a denúncia, o Ministério Público acusou-a de conduzir o veículo alcoolizada e em velocidade incompatível com o limite permitido na Avenida Miguel Sutil, onde ocorreu o acidente, “assim como assumindo o risco de produzir o resultado, matou a vítima Francisco Lucio Maia”.
Ainda segundo o MP, a denunciada, após atropelar o verdureiro, deixou de prestar socorro imediato à vítima, bem como afastou-se do local do acidente para fugir à responsabilidade civil e penal.
“Segundo restou apurado, a denunciada Leticia Bortolini e seu esposo Aritony de Alencar Menezes, ambos médicos, na data dos fatos (sábado) estiveram no evento denominado Braseiro que, dentre outras características, operava no sistema open bar (consumo livre de bebida alcoólica), sendo que certamente permaneceram no local das 14 horas até aproximadamente 19h30. Mesmo tendo ingerido bebida alcoólica a denunciada assumiu a condução do veículo pertencente ao casal”, diz trecho da denúncia.
Na denúncia, o órgão ressaltou que assim que atropelou o verdureiro, a médica seguiu a condução do veículo, sob a influência de álcool, operando manobras em zigue-zague até a entrada do seu condomínio, no bairro Jardim Itália, conforme relato de testemunha.