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É válido pedido de congelamento de dados telemáticos antes de autorização judicial

Por unanimidade, a 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça considerou válido o pedido feito pelo Ministério Público sem autorização judicial para que provedores de internet congelassem dados telemáticos de usuários, preservando-os para fins de investigação criminal.

O colegiado negou pedido de Habeas Corpus em favor de uma mulher investigada na operação "taxa alta", que apura diversos crimes relacionados a licitações no Detran do Paraná. No STJ, a defesa sustentou a tese de nulidade das provas obtidas por meio da quebra de dados telemáticos, alegando que o MP estadual teria, antes de apresentar um pedido à autoridade judicial, enviado ofícios às empresas Apple e Google, a fim de impedir a livre disposição, por parte de seus titulares, dos dados telemáticos que estivessem armazenados com elas.

Segundo o relator do caso, desembargador convocado Olindo Menezes, o Marco Civil da Internet (Lei 12.965/2014) tornou mais eficiente o acesso a dados para fins de investigação criminal, ao possibilitar que o Ministério Público requeira diretamente ao provedor a sua guarda, em ambiente seguro e sigiloso, evitando o descarte dos conteúdos pelos usuários.

"O pedido de congelamento do Ministério Público, contra o qual se rebelam os impetrantes, e diversamente do que advogam, não precisa necessariamente de prévia decisão judicial para ser atendido pelo provedor, mesmo porque – e esse é o ponto nodal da discussão, visto em face do direito à preservação da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem das partes (artigo 5º, X, da Constituição Federal e artigo 10 da Lei 12.965/2014) – não equivale a que o requerente tenha acesso aos dados congelados sem ordem judicial", observou o relator.

Segundo Olindo Menezes, o Marco Civil da Internet dispõe que a guarda e a disponibilização dos registros de conexão e de acesso a aplicações de internet, de dados pessoais e do conteúdo de comunicações privadas devem atender à preservação da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem. Ele ressalvou, no entanto, que o provedor responsável pela guarda está obrigado a disponibilizar tais registros, mediante ordem judicial, quando a finalidade for a produção de provas em processo cível ou criminal.

Por outro lado, apontou o magistrado, o congelamento do conteúdo telemático nos provedores de internet recebe tratamento específico da Lei 12.965/2014, que afirma ser dever jurídico do administrador do respectivo sistema autônomo manter os registros de conexão, sob sigilo, em ambiente controlado e de segurança, pelo prazo de um ano; e, no caso do provedor de aplicações de internet, pelo prazo de seis meses.

De acordo com a legislação, a autoridade policial ou administrativa, ou, ainda, o Ministério Público, poderão requerer cautelarmente que os registros de conexão sejam guardados por prazo superior ao previsto, devendo, em até 60 dias após o requerimento, ingressar com o pedido de autorização judicial para o acesso aos registros (artigos 13 e 15 da Lei 12.965/2014).

Na hipótese analisada, o Ministério Público requereu a preservação de dados e conteúdos eletrônicos às plataformas em 22 de novembro de 2019 — o que foi mantido em segredo – e ingressou com pedido de quebra do sigilo desses dados em 29 de novembro, tendo o juiz deferido fundamentadamente o pleito em 3 de dezembro daquele ano.

De acordo com o relator, ao solicitar a preservação dos dados, o Ministério Público seguiu o que preceitua o Marco Civil da Internet. Quanto à disponibilização dos conteúdos, frisou: "Deve sempre ser precedida de autorização judicial devidamente fundamentada, o que ocorreu no presente caso".

Segundo Guilherme Braguim, advogado do escritório ASBZ Advogados, a decisão estabelece um importante precedente em relação à interpretação dos artigos 10, 13 e 15 do Marco Civil da Internet (Lei no. 12.965/14) e do combate aos ilícitos na rede.

Os artigos 13 e 15 dispõem sobre a obrigatoriedade de manutenção dos registros por provedores de conexão e de aplicação pelo prazo legal, mas ambos também indicam que tais registros só podem ser fornecidos para terceiros mediante ordem judicial prévia. O artigo 10, por sua vez, indica que a guarda desse tipo de dados, bem como de dados pessoais e do conteúdo de informações, devem sempre atender à preservação da intimidade, da honra e da imagem das partes, destacando também que tais registros somente poderão ser disponibilizados mediante ordem judicial prévia.

"Dessa forma, o decidido pelo STJ contribui para a maior eficiência na investigação de condutas na internet, na medida em que confirma que dados telemáticos que, eventualmente, poderiam se perder em razão do decurso de tempo mínimo de guarda pelos provedores, sejam mantidos de forma sigilosa pelos provedores de forma prévia para que sejam fornecidos quando devidamente determinado pela Justiça", afirmou.  Com informações da assessoria de imprensa do STJ.

HC 626.983

Redação

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