Em meio à tensão política, ao choque entre Poderes e à longa crise sanitária, caiu a confiança do brasileiro em relação a diversas instituições do país, aponta o Datafolha.
Pesquisa do instituto feita dos dias 13 a 15 deste mês mostra que, em relação ao levantamento anterior, realizado em julho de 2019, subiu a desconfiança da população acerca do Executivo, Legislativo e Judiciário, além de outros atores institucionais, como o Ministério Público.
A Presidência da República foi a instituição com a maior piora: tinha a desconfiança de 31% dos entrevistados em 2019 e agora está com 50%.
O Datafolha, nessa rodada, ouviu presencialmente 3.667 pessoas em 190 municípios brasileiros. A margem de erro é de dois pontos percentuais, para mais ou para menos.
No ranking da confiança popular, novamente o primeiro lugar ficou com as Forças Armadas, com 76%. A desconfiança, porém, aumentou numericamente em relação a dois anos atrás, atingindo a taxa mais alta da série histórica iniciada em 2017. Eram 19% em 2019 e agora são 22%.
Pilar do governo Jair Bolsonaro, as Forças estiveram no centro de controvérsias políticas neste ano de uma maneira como não se via desde a ditadura militar. Em março, os comandantes do Exército, Marinha e Aeronáutica foram trocados simultaneamente por Bolsonaro.
Nos últimos meses, o presidente também avançou em uma retórica golpista, despertando temores de que tentará provocar confusão, com a adesão de militares, na campanha eleitoral do próximo ano. Um símbolo dessa incerteza foi o desfile de blindados feito na Esplanada dos Ministérios em 10 de agosto, mesmo dia da votação na Câmara de proposta sobre o voto impresso, bandeira bolsonarista.
Entre os dez pesquisados pelo Datafolha, o pior resultado ficou com os partidos políticos, que sofrem a desconfiança de 61% dos entrevistados. A rejeição às agremiações era de 58% em 2019 e agora está em 61%.
O sentimento antipolítica também atinge fortemente o Congresso Nacional, visto como não confiável por 49%.
A imprensa, alvo de críticas constantes do bolsonarismo, tinha a desconfiança de 30% há dois anos e agora está com 32%. Dizem confiar na imprensa 66%, divididos em 48% que afirmam confiar "um pouco" e 18% que dizem "muito".
O Ministério Público, que costuma ser bem avaliado pela população, teve um revés nessa rodada do Datafolha. Disseram que não confiam na instituição 30%, ante 23% em 2019.
Os procuradores e promotores estão às voltas com uma gestão cheia de percalços do procurador-geral da República, Augusto Aras, que foi indicado por Bolsonaro ao cargo sem o aval da categoria.
Aras tem sido criticado por não agir contra o governo federal, por exemplo, em relação às falhas na resposta à pandemia. Também foi dele a iniciativa de mudar o modelo de trabalho da Lava Jato, com o encerramento das forças-tarefa neste ano.
A operação também trouxe desgaste ao Ministério Público nos últimos anos, com questionamentos especialmente ao grupo que atuava no Paraná. O vazamento de diálogos de procuradores no Telegram com o então juiz Sergio Moro, no caso conhecido como Vaza Jato, agravou as contestações à conduta do órgão.
O Datafolha também perguntou aos entrevistados sobre as redes sociais. Disseram que não confiam nelas 53% –eram 46% na pesquisa anterior. Afirmam que confiam 46%, sendo que 40% disseram "um pouco" e 6%, "muito".
Em relação às grandes empresas brasileiras, 29% disseram não confiar, e 69% afirmaram que confiam.
O detalhamento dos dados da pesquisa mostra diferenças de opinião entre diversos segmentos da população.
Os jovens de 16 a 24 anos tendem a confiar mais nos partidos políticos, no Judiciário e no Congresso. Na direção oposta, são mais céticos sobre a imprensa.
As Forças Armadas têm imagem melhor entre homens, quem tem renda familiar acima de cinco salários mínimos e moradores de Centro-Oeste.
O Judiciário, que no quadro geral tem a desconfiança de 31% dos entrevistados, no Nordeste é visto dessa maneira por 34%.
Os resultados da pesquisa também variam de maneira expressiva de acordo com as preferências políticas do entrevistado.
Entre eleitores que dizem que votarão em Bolsonaro em 2022, a desconfiança na imprensa passa de 32% para 47% e, em relação às redes sociais, cai de 53% para 46%.
Os eleitores bolsonaristas também desconfiam mais do Supremo Tribunal Federal.
Já os entrevistados que dizem que votarão em Luiz Inácio Lula da Silva no próximo ano tendem a ser mais avessos ao Ministério Público. O petista se tornou um crítico de procuradores ao longo de seus embates com autoridades da Lava Jato e chegou a processar o ex-chefe da força-tarefa de Curitiba, Deltan Dallagnol.
Entre eleitores de Lula, os que não confiam nos promotores e procuradores passam de 30% para 33%.
Quem pretende votar no PT em 2022 também tende a apoiar menos as Forças Armadas. A taxa de desconfiança nesse segmento passa de 22% para 32%.