O Ministério Público do Trabalho em Mato Grosso (MPT-MT) obteve tutela provisória de urgência em face da Bom Futuro Agrícola Ltda., a maior produtora individual de soja do mundo e maior na cultura do algodão no Brasil. A Justiça do Trabalho determinou que, em 90 dias, a empresa cumpra uma série de obrigações relacionadas à saúde e segurança do trabalho, a fim de evitar que novos acidentes, como o que levou um empregado de 21 anos à morte em abril de 2019, voltem a ocorrer.
Hélio Gomes Monteiro Neto trabalhava para a Bom Futuro, no município de Sapezal, distante mais de 500km de Cuiabá. Ele faleceu enquanto operava uma empilhadeira para descarga de um transformador de 550kg, que foi envolto com um cinto de amarração, sendo que o trajeto envolvia percorrer um terreno de chão batido. Durante a movimentação da empilhadeira, a máquina tombou, deixando o trabalhador debaixo dela e a carga suspensa no ar.
Segundo sua ficha de registro e espelho de ponto, Neto havia sido contratado como conferente, atividade que, de acordo com o Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional (PCMSO) e o Programa de Prevenção de Riscos Ambientais (PPRA) da empresa, consiste em conferir a entrada e a saída de materiais, controlar estoque, inspecionar o estado das mercadorias, além de outras funções que não incluem a operação de máquinas. Apesar disso, a empresa exigiu dele serviços de operador de empilhadeira sem ao menos fornecer-lhe capacitação para desempenhar tal atividade.
“A ausência de capacitação para operar empilhadeira, a não exigência de cartão de identificação para operar máquina autopropelida, a falta de permissão de trabalho — ordem de serviço, a ausência de procedimentos de trabalho, a inexistência de indicação da capacidade máxima suportada pela empilhadeira, a falta de manual de instruções, o uso de cinta de forma improvisada, tudo isso contribuiu para o acidente e constitui descumprimento grave de normas de saúde e segurança do trabalho”, pontua o MPT.
Na decisão, ao analisar as provas juntadas pelo MPT e os documentos apresentados pela empresa, o juiz Muller da Silva Pereira, em atuação na Vara do Trabalho de Campo Novo do Parecis, sublinhou que “o cenário até então delineado nos autos demonstra que os empregados da acionada que atuam nas atividades de operador de empilhadeira se submetem a significativo perigo”.
A tutela vai ao encontro do que evidenciou o MPT sobre o descumprimento reiterado de normas de segurança. “Um fato gravíssimo verificado foi que a demandada já havia sido autuada [pela Superintendência Regional do Trabalho], em 2017, por manter trabalhador operando empilhadeira sem a devida capacitação e por infringir outras normas de segurança, que provocaram um acidente grave, consoante relatório de fiscalização e autos de infração lavrados em dezembro de 2017. Trata-se, portanto, de prática habitual".
O MPT reforça que a Bom Futuro continuou a descumprir a legislação trabalhista e as Normas Regulamentadoras (NRs) do Ministério da Economia mesmo depois do acidente grave que já havia ocorrido em 2017, da lavratura de autos de infração contra a empresa e da notificação registrada no Livro de Inspeção do Trabalho. “A exposição dos trabalhadores a risco elevado, a possibilidade de novos acidentes ocorrerem e, incontroversamente, a clara possibilidade de manutenção e reiteração dos ilícitos praticados tornam evidente e manifesto o perigo de dano”.
Entre as obrigações de fazer e não fazer impostas à empresa pela Justiça do Trabalho estão a de anotar no registro de empregado e em CTPS a função do trabalhador que opera e realiza intervenções em máquinas ou equipamentos e a de proibir e impedir que trabalhador opere máquina autopropelida sem portar cartão de identificação, com nome, função e fotografia em local visível, dentro do prazo de validade de 1 ano, a ser renovado mediante exame médico, conforme as Normas Regulamentadoras 7 e 11.
A Bom Futuro deverá, ainda, elaborar procedimentos de trabalho e segurança para máquinas e equipamentos, específicos e padronizados, a partir da apreciação de riscos, incluindo-se os trabalhos que exijam a utilização de cinta de amarração ou equivalente; indicar, em lugar visível do equipamento utilizado na movimentação de materiais, a carga máxima de trabalho permitida; possuir manual de instruções da empilhadeira e das demais máquinas e implementos, mantendo-o disponível para consulta pelos trabalhadores; abster-se de utilizar a empilhadeira em piso inadequado para o seu uso ou em desconformidade com outras especificações ou limitações técnicas para sua utilização com segurança, conforme manual de instruções; e exigir a utilização da cinta de amarração em conformidade com as normas técnicas.
Por fim, a empresa deverá fornecer capacitação específica para operação de empilhadeiras e demais máquinas autopropelidas e implementos, observando o programa de capacitação em etapa teórica e prática, com carga horária mínima de 24 horas distribuídas em até 8 horas diárias, de acordo com requisitos e conteúdo programático previstos nas NRs 12 e 31.
Todas essas obrigações deverão ser cumpridas no prazo de 90 dias, sob pena de aplicação de multas que vão de 10 mil a 30 mil reais por irregularidade constatada. Uma audiência está marcada para o dia 31 de maio.