Opinião

Vento ventania

Andar na Belina do seu Ciriaco tinha uma emoção diferente. No painel, só funcionava a quilometragem, tínhamos de anotar a de saída e da volta para controle de gasolina, cinto de segurança eram de 2 pontas que não funcionavam, o rádio só funcionava uma estação, para nossa sorte, era a Rádio Cidade. Era 1994, uma terça como outra qualquer, muito calor, uma crise de lascar, Biquini Cavadão a todo volume, mas alheio a tudo, João Paulo cantando nervoso além do normal.

– Me deixe cavalgar nos seus desatinos, Nas revoadas, redemoinhos- bora Jota!

Tentava disfarçar pra ele mesmo. Era seu primeiro encontro com essa menina linda, que deixou ele totalmente de quatro. Seu nome, Mariela.  O encontro era no longínquo Bairro Jardim Califórnia. Sim, naquela época cruzar a Fernando Corrêa era uma verdadeira viagem. A reunião foi na casa da Milena. Casa imponente. Eu e João Paulo nos entreolhamos e tocamos a campainha. Mariela atendeu. Entramos. Lá tinham algumas pessoas, todos pareciam muito íntimos. Mariela e João Paulo, como num passe de mágica, somem. Fiquei sentado isolado num canto com aquela cara “O que estou fazendo aqui”. Poucos minutos de isolamento, um rapaz chega perto, me dá uma lata de cerveja e as risadas grita:

– Você é segurança de João Paulo? Se não é desemburra e vem sentar com a gente, porra!

Era Ricardo Amaral. Foi a primeira vez que o vi. E todas as outras vezes foi sempre assim, brincalhão, de personalidade forte, como todo cuiabanão, falando alto que só ele. Nesses mares da vida, fui percorrer esse mundão. 12 anos depois, de volta a cidade, fui levar meu filho mais velho no cinema. Uma Ferrari azul buzinando sem parar, chega do meu lado acelerando, fazendo a gente levar o maior susto:

– O Jawn Gordo! O tempo passa e você fica mais feio!

Era Ricardo. Havia virado o midas do mercado imobiliário. Como minha agência era próxima a distribuidora do seu irmão, GV, me procurou algumas vezes para fazer trabalhos. Chamava ele de deputado. De maestro. Sempre numa posição de destaque. A qual ele sempre fez por merecer. Algumas semanas atrás, ele me ligou:

– Jawn! Precisamos fazer um feirão Padrão RA! E nada de chamar feirão. Tem que ser algo cabeceira.

Essa foi a última vez que falei com ele. Foi diagnosticado com COVID, no quarto dia em casa sentiu falta de ar, quando chegou no hospital, já era tarde demais, 80% do pulmão estava comprometido. Essa doença é assim: não importa se é mocinho ou bandido, não importa se é de direita ou esquerda, não importa o seu plano saúde.

Que Deus receba Ricardo com o padrão R.A., Amém.

Redação

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Reportagens realizada pelos colaboradores, em conjunto, ou com assessorias de imprensa.

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