Os povos indígenas que vivem às margens do Rio Teles Pires, na região norte do estado, denunciaram que, após a construção de uma usina hidrelétrica no Rio Teles Pires, a água, antes consumida diretamente no rio pelas populações, foi poluída e os sistemas de abastecimento instalados não são suficientes para garantir o acesso à água potável.
De acordo com o Instituto Centro de Vida (ICV), os relatos foram feitos durante em audiência judicial na quarta-feira (2). A entidade afirma que essa é a primeira vez em que os povos indígenas foram ouvidos desde a chegada das usinas hidrelétricas na região, há dez anos.
A audiência é um desdobramento de uma ação civil pública proposta pelo Ministério Público Federal (MPF) em 2014, um ano antes do início das atividades da usina.
Na ação, o MPF pede a responsabilização da Companhia Hidrelétrica Teles Pires e do governo federal para o efetivo abastecimento de água potável aos povos da região.
A Justiça autorizou o ingresso da Associação Indígena Munduruku Dace no processo caso todos os documentos necessários sejam providenciados e apresentados para o magistrado na próxima semana.
Com isso, os indígenas poderão ser representados de forma independente, direito garantido pelo artigo 232 da Constituição Brasileira.
Centenas de famílias dos povos Apiakás, Kaiabi e Munduruku são impactadas diretamente pela usina, alvo da ação, e de mais três usinas hidrelétricas na região.
No caso da UHE Teles Pires, os impactos diretos sobre o rio começaram a ser sentidos a partir de agosto de 2011, quando o Ibama concedeu a Licença de Instalação da obra.
Em 2019, os quatro empreendimentos passaram a impactar simultaneamente os povos indígenas e comunidades tradicionais na área e tornou o Teles Pires o rio mais impactado por grandes hidrelétricas na Amazônia.
O acesso à água de qualidade para beber e tomar banho é apenas um dos efeitos das mudanças na água.
Além da poluição da água, os efeitos da barragem no pulso de inundação do rio, com agravamento das secas e cheias, alteram a reprodução dos peixes e limitam a navegação.
Locais sagrados aos indígenas ficaram sob risco, como as corredeiras de Sete Quedas, que sofreu inundação pela barragem da UHE.
Para a audiência, eram previstos os testemunhos de dois representantes de cada povo. Os dois representantes dos Apiakás, entretanto, não puderam comparecer e foram substituídos, mas os depoimentos não foram colhidos.
As atividades da hidrelétrica impactam a Terra Indígena Apiaká e Isolados, área protegida de cerca de 982 mil hectares e onde há a presença de populações indígenas isoladas. A legislação brasileira prevê a proteção especial aos povos indígenas isolados, proibindo a construção de empreendimentos que coloquem suas áreas e modos de vida sob qualquer tipo de risco.
A área também faz sobreposição com a Reserva Ecológica Apiakás, unidade de conservação de proteção integral.
De acordo com as testemunhas, os sistemas de abastecimento de água instalados em algumas das aldeias após a chegada das UHEs são precários e faltam recursos para manutenção.
Na aldeia São Benedito, por exemplo, o poço artesiano precisa de óleo para funcionar, o que não foi fornecido aos moradores.
A empresa alega a realização de uma perícia na água do rio após o início das atividades da usina em que é atestado o bom nível de qualidade.
Os indígenas, entretanto, afirmam que o teste nunca foi apresentado às comunidades e que a mudança no recurso é clara.