Não tenho simpatia pelo governador de São Paulo João Doria. Na verdade o considero um almofadinha petulante e inconfiável, entretanto torço por ele e, consequentemente por todos os brasileiros, na sua batalha em chegar à frente com a vacina chinesa Coronavac que ele encampou através do Instituto Butantan.
Não me incomodo com os ganhos políticos que possa ter se essa vacina chegar primeiro e começar ainda este ano a imunização no estado que ele governa e expandir, como é seu plano, para todo o País.
Mas há um empecilho quase intransponível que é o ciúme doentio do Presidente Bolsonaro, declaradamente contra a vacina, porque ela é chinesa e por estar sendo produzida em São Paulo.
Na terça passada parecia que uma inesperada onda de bom senso atingia o País quando o Ministro da Saúde atendendo demandas dos estados brasileiros anunciava a compra de 46 milhões de doses da Coronavac. Mas bastou amanhecer a quarta-feira para o Presidente, estimulado pelos seus seguidores fanáticos, desautorizar grosseiramente seu ministro, desdizendo o que ele falou no dia anterior.
Aqui é bom anotar que o Butantan é uma instituição centenária da mais alta credibilidade e o maior produtor de vacinas do Brasil. Ele nunca embarcaria em uma aventura de distribuir qualquer imunizante antes de ser aprovado em todos os testes. Além disso, qualquer vacina depende da aprovação da Anvisa.
Em vez de ficarmos criticando a China para agradar os Estados Unidos, deveríamos levar em conta que enquanto o Trump quer a América em primeiro lugar, inclusive comprando vacinas antes dos outros, a China assume o compromisso de dispor a dela como bem mundial.
Nossa urgência atual é a vacina, não importa se a de Oxford, da China ou qualquer outra. A que chegar primeiro precisa ser abraçada com entusiasmo pelo Ministério da Saúde que já deveria estar programando a aplicação em todo o território nacional, ainda que seja, no primeiro momento, só para os grupos de risco.
Não se espere do Presidente Bolsonaro nenhum esforço neste sentido. Na verdade como ele sempre negou a gravidade da pandemia e a severidade da doença parece que não vê a importância e urgência da vacina. Agora mesmo ele volta a dizer que no Brasil a vacinação não será obrigatória.
Não é hora de ficar discutindo obrigatoriedade ou não da imunização, mesmo porque neste momento ela não tem importância. No início somente serão vacinadas as pessoas dos grupos de risco que certamente buscarão avidamente a oportunidade de imunizar-se. Enquanto isto sobrará tempo para os políticos se entenderem ou, o que parece mais provável, o Supremo arbitrar essa briga boba.
Saibam aqueles que não se importam com a origem das vacinas, mas somente com sua eficiência e segurança, que o imunizante chinês certamente sofrerá sério boicote político na tramitação pela Anvisa. Conhecendo o gosto do Presidente pelo conflito, é legítimo supor que muitos morrerão desnecessariamente só porque ele odeia a China que criou o imunizante tanto quanto detesta o João Doria que o trouxe para o Brasil.
Renato de Paiva Pereira – empresário e escritor