O que escrever nos primeiros passos de 2020? Saúdo, caros leitores, com uma mensagem que encarna sinceros votos de um feliz 2020, apoiada na cosmologia da etnia Wayana e Aparai, dentre os 216 povos indígenas no Brasil, são apontados à aspiração de bons ventos para o ano nascente.
No igarapé Axiki, afluente do rio Paru de Leste, Tulupere, uma enorme serpente, de flancos ornados com belas pinturas, habitava águas dos territórios dos Wayana e Aparai, localizados no Amapá, Pará, Guiana Francesa e Suriname. O ser sobrenatural, ao virar as canoas dos índios, tornava inacessível a navegação e impossibilitava as relações entre os povos. Os sobreviventes ao naufrágio eram devorados por Tulupere e, por isso, os povos Wayana e Aparai nunca se encontravam.
A constância dos náufragos em consequência da voracidade da serpente levou um grupo Wayana, auxiliado por um pajé, a derrotá-la. No embate, os índios puderam ver que os flancos de Tulupere eram adornados com pinturas pretas (jenipapo) e vermelhas (urucum). Mais tarde foi a vez do povo Aparai quando encontrou o monstro tombado, avistando apenas um dos lados de seu corpo. Sem se preocupar com a
ferocidade do monstro, pois ali jazia, conseguiu, com calma, ver com minúcias as pinturas que estavam expostas.
Enquanto o grupo de homens da etnia Wayana teve a oportunidade de observar os motivos ornamentais dos dois flancos de Tulupere, mesmo que em condições de extrema tensão, o povo Aparai, que não visualizou todos eles, captou com extrema habilidade suas formas.
O fim de Tulupere providenciou a união entre os dois povos, que passaram a manter relações matrimoniais. Da morte da serpente nasceu o encontro amistoso entre os povos Wayana e Aparai, o primeiro detentor de um repertório extremamente diversificado de pinturas e o segundo de uma técnica aperfeiçoada de confecção artística.
Que 2020 proporcione maior aliança entre gentes, povos, cônscios de que juntos podem fortalecer suas identidades e construir uma felicidade vindoura, com base na igualdade, retidão, equanimidade.