Entre as causas externas, os acidentes de transporte terrestre (ATT) destacam-se como importante fator de morbidade e mortalidade e, apesar da redução do número de mortes nas estradas, a Organização Mundial de Saúde (OMS) avalia que estes óbitos continuam inaceitavelmente altas. Em Mato Grosso, dados da Secretaria Adjunta de Atenção e Vigilância em Saúde, ligada à Secretaria de Estado de Saúde (Ses-MT), demonstram que, em 2018, foram realizadas 4.995 hospitalizações causadas por sinistros de trânsito com um custo da ordem de R$ 6,1 milhões para o Sistema Único de Saúde (SUS), apenas no âmbito estadual.
Segundo levantamento do órgão estadual, os ATTs configuram-se como a segunda causa de morte dentre as causas externas e, nos últimos cinco anos, ocorreram 5.238 vítimas fatais em todo o Estado, sendo registrada uma média de 1.048 mortes por ano. Neste mesmo período, foram realizadas 26.602 internações, ao custo total de R$ 28,5 milhões para o SUS, sendo o custo médio por ano de R$ 5,7 milhões. “Os custos crescentes com internações por acidentes, calculando com base no custo “real”, além do faturamento, chegam a mais de 20 milhões ano”, informou.
Às vítimas, o SUS é responsável por prestar o atendimento médico necessário. Esses acidentados também podem ter direito a uma proteção social denominado Danos Pessoais Causados por Veículos Automotores de via Terrestre (Dpvat). Conforme a Ses-MT, as pessoas mais carentes recorrerem ao recurso para complementar a assistência ao longo do tratamento, até a sua plena recuperação. Mas, esta indenização pode estar com os dias contados. Isso porque o presidente Jair Bolsonaro assinou na última segunda-feira (11) medida provisória (MP) extinguindo, a partir de 1º de janeiro de 2020, o Dpvat.
A MP também terá impacto no SUS e em programas públicos para educação e prevenção na área. Isso porque a União recebe metade do arrecadado com o seguro, como determina a legislação. Dados disponibilizados no site do Ministério da Economia apontam que cerca de R$ 2,26 bilhões foram arrecadados neste ano, distribuídos da seguinte forma: 50% (R$ 1,13 bilhão) para o Consórcio do Seguro Dpvat; 5% (R$ 134 milhões) ao Denatran; 45% (1,2 bilhão) para o SUS.
Neste último caso, o valor é rateado entre todos os Estados e de acordo com o número populacional. “O corte dessa receita tem seus efeitos a médio e longo prazo, pois possivelmente acarretará no aumento de demandas de pessoas em busca de outros serviços complementares do SUS, para o seu tratamento”, observou Ses-MT. Pela proposta, os acidentes ocorridos até 31 de dezembro de 2019 continuam cobertos pelo seguro. A atual gestora do seguro, a Seguradora Líder, permanecerá até 31 de dezembro de 2025 como responsável pelos procedimentos de cobertura dos sinistros ocorridos até a da de 31 de dezembro deste ano. Para valer como lei, a MP ainda precisa passar pela aprovação do Congresso Nacional.
De acordo com o governo, a decisão foi tomada levando em consideração a baixa eficiência desse instrumento, além de casos de fraudes, problemas com órgãos de controle e altos índices de reclamação. Em 2015, o Departamento de Polícia Federal deflagrou a operação “Tempo de Despertar”, com o objetivo de combater fraudes nas esferas administrativa e judicial relativas ao pagamento do Seguro Dpvat, havendo mandados de prisão temporária, conduções coercitivas, busca, apreensão, sequestro de bens e afastamento de cargo público.
Além disso, aponta que o Ministério Público do Estado de Minas Gerais (MG), em 2017, alertou sobre possível ocorrência de fraudes no pagamento de indenizações do seguro, sendo evidenciada a proposição de mais de 120 ações penais e civis públicas envolvendo diversos agentes, como advogados, empresários, servidores públicos, médicos e fisioterapeutas, além da Seguradora Líder.
Ainda, segundo o governo, o Tribunal de Contas da União (TCU) apresentou, nos últimos anos, sete acórdãos sobre o Seguro Dpvat. Dentre as recomendações advindas desse órgão, destaca-se a possibilidade de a Superintendência de Seguros Privados (Susep) estudar a viabilidade de alteração do modelo adotado de gestão de recursos. “Atualmente, há cerca de 370 mil ações judiciais em tramitação relacionadas ao Dpvat, sobrecarregando o Poder Judiciário. São recebidas na Susep, por ano, uma média de 5.825 reclamações, e foram abertos 54 processos administrativos consumidores e 100 processos administrativos sancionadores. Apenas no último ano, 15.648 fraudes foram identificadas”, informou o Ministério da Economia.
O Dpvat é um seguro obrigatório pago anualmente por todos os proprietários de veículos terrestres, tais como, motocicletas, automóvel particular, táxi e carro de aluguel, ônibus, micro-ônibus e lotação com cobrança de frete. Em caso de acidente de trânsito, o seguro cobre despesas médicas não realizadas pelo SUS, podendo se requerer até R$ 2.500,00. Em caso de invalidez permanente ou morte, a vítima ou sua família recebe até R$ 13.500,00. A indenização pode ser solicitada à Seguradora Líder até três anos depois da data do acidente ou da ciência da invalidez ou da morte.