Política

‘Os deputados entenderam que as propostas do Mauro são de Estado e não de governo’

O governador Mauro Mendes conseguiu autorização da Assembleia Legislativa para aplicar medidas polêmicas, fiscais e administrativas, num cenário de gestão nova e deputados novatos. A resistência que parecia se formar no início da atual legislatura foi diluída e apenas alguns parlamentares mantêm a postura de nítida oposição. Na prática, houve chancela do Legislativo para Mendes começar a governar a partir de regras do jogo dele. O líder do governo, Dilmar Dal Bosco (DEM), diz que articulação em um semestre intenso se direcionou mais para questões técnicas (legalidade ou não das propostas) do que para embate político. O momento mais crítico para ele ocorreu às vésperas da votação do projeto de reinstituição dos incentivos fiscais, quando houve boato de crise e saída dele da posição. Dal Bosco não diz não saber de onde saiu a informação e nega que tenha fundo de verdade. “Nem o governador e nem secretários me falaram sobre o assunto”. Ao Circuito Mato Grosso, ele afirmou que os deputados entendem que as proposta de Mendes são para o Estado e que o governo de Pedro Taques, no último ano, foi prejudicado por secretários que tomaram decisão como pré-candidatos.

Circuito Mato Grosso: Foi um primeiro semestre intenso, deputado.

Dilmar Dal Bosco: Acho que sim. Tivemos várias matérias que chamaram muita discussão e muita a atenção, e vejo como positivo todas as mensagens do governo terem sido aprovadas. Nós tivemos sempre a maioria, mesmo ainda em algumas situações a oposição votando favorável, a maioria dos projetos ela votou a favor do governo.

CMT: No começo do ano, o pacote fiscal, com mudanças administrativas no Executivo, parecia mais importante; há poucas semanas, a reinstituição dos incentivos fiscais também provocou apelo. Qual o senhor considera mais importante?

DDB: Quando se assume um governo é a mesma coisa que ser um gerente de banco, e você precisa moldar aos critérios que se queira trabalhar para trazer resultados a quem te contratou. O Estado contratou [o governador] Mauro Mendes para trazer, de forma positiva, resultados. Acho que o Mauro entrou com o pé direito, com posicionamento firme, forte. Estava faltando gestão no Estado. Mato Grosso, no contexto dos contribuintes, não pode mais viver só no mundo do Estado – os Poderes e o custo da máquina elevado. A reforma administrativa foi feita, talvez, não tão agressiva quanto poderia ter sido feita, mas precisava ser feita. O número de secretarias diminuiu de 24 para 15 e trouxe economia para o Estado de R$ 150 milhões, no primeiro quadrimestre. Avançamos um pouco na cobrança do Fethab (Fundo Estadual de Transporte e Habitação); fomos criticados, mas era uma maneira de aliviar o Estado, tentar salva-lo do déficit orçamentário. O Estado, no acumulo de seis anos, tem dívida de quase R$ 4 bilhões, e no início deste ano estava devendo pra Samu (Serviço de Atendimento Móvel de Urgência), hospitais regionais e os municípios.

CMT: A reinstituição dos incentivos tem menos peso?

DDB: Tivemos uma dedicação quase exclusiva a ela, mas tivemos que cumprir algo, que não foi o Mauro Mendes que inventou. Foi feita uma lei no Congresso Nacional, em 2017, falando que os Estados brasileiros teriam dois anos, até 31 de julho de 2019, fizessem uma lei específica, trazendo para dentro [da legalidade] tudo que tivesse de renúncias e incentivos fiscais, para que pudesse depositar no Confaz (Conselho Nacional de Políticas Fazendária).  Nisso tivemos que trazer alguns segmentos que estavam na ilegalidade, exemplo do setor frigorífico, suinocultura, avicultura. Foi o assunto mais polêmico a ser votado na Assembleia, tanto que tivemos uma sessão histórica de 12 horas.

CMT: A atual legislatura é nova na grande maioria e o governo também é novo. Como foi articular a votação de assuntos tão complexos?

DDB: Eu assumi um compromisso com o governador Mauro Mendes de estar líder do governo dele na Assembleia. Cabe a ele, lógico, todas as atitudes de permanecer ou não [com a liderança]. Mas, ele dá uma missão, a missão de vir pra dentro. Eu me coloco num nível estável em relação aos outros deputados, não que seja inferior ou superior a eles.  Tudo que eu trato com os colegas deputados, eu trato com clareza, lealdade, discussão positiva, dando valorização de atitudes que faça com que o próprio colega queira participar. Não sou de afronta em tribuna, sou de esperar por uma análise até, em muitos casos de exaltação, o colega esteja calmo.  Acho que esse entendimento valeu bastante. Agora, lógico que você pega uma Assembleia que alterou bastantes, são 14 novos deputados. Você pega alguns com o ânimo do fazer, para dar resultado aos eleitores, neste caso, você tem um pouco de dificuldade porque você tem que conhecer o perfil. Com o início dos deputados novos, tivemos discussões mais calorosas. Mas, é a tranquilidade que leva a vencer e aprovar projetos.

CMT: Quais foram as dificuldades mais recorrentes no convencimento para os projetos já aprovados?

DDB: Acho que o entendimento da lei. Tivemos algumas situações da pessoa debater um assunto que não era o que estava sendo tratado. Pessoa ter clareza do que está na lei, do que diz cada artigo, cada parágrafo. Cada deputado que está aqui tem sua formação, alguns são médicos. Não quero dizer que não tenham conhecimento de outros assuntos, mas ainda estão procurando aprender. Isso é um trabalho do dia a dia, e até eles chegarem a isso, vamos ter algumas dificuldades.

CMT: Pesando conhecimento técnico e viés político, qual pesa mais para um lado da balança, na articulação?

DDB: O debate está sendo bom. O Partido dos Trabalhadores (PT) tem dois colegas aqui dentro – Valdir Barranco e Lúdio Cabral – que se aprofundam na discussão. Eles têm ideologia partidária e se posicionam nas votações. O Valdir Barranco em alguns momentos vota com o governo. Wilson Santos (PSDB) era situação do governo Pedro Taques e hoje se posiciona como oposição realmente, mas não deixa de ajudar a também produzir projetos, e quase na maioria das vezes vota favorável ao governo. A Assembleia só realmente muito quando tem discussão de matéria, exemplo o PLC [Projeto de Lei Complementar dos incentivos] 53 que teve participação de vários deputados.

CMT: No caso do PLC, o senhor fez trabalho de formiguinha, indo ao gabinete de cada um para explicar o assunto?

DDB: Você tem que ir, por isso que toda vez que tivemos com segmentos tivemos que envolver os deputados para que eles saibam qual é o assunto, qual é a reivindicação do setor segmento e o que nós [deputados] estamos produzindo para o projeto. Esse diálogo ajuda a afastar problemas. Por exemplo, o Lúdio poderia ter pedido vista do projeto na quinta-feira da semana de votação porque a impressão do texto teve falha, mas ele entendeu e deixou seguir o trâmite, no terceiro substitutivo. Preciso elogiá-lo por isso. Temos que ter diálogo, mesmo que a posição seja radical de votar sempre contra. Olha que é um projeto de 58 artigos, extenso, para análise num curto período.

CMT: Houve dificuldade com deputados que quiseram contestar para atrapalhar o trâmite?

DDB: Eu não entendo isso. Houve discussão sobre o projeto e sessão de 12 horas, respeitando cada ação, cada uma das 92 emendas apresentadas.

CMT: O PLC 53 teve 92 emendas e apenas seis passaram. Gerou mal-estar?

DDB: Não, porque é voto vencido. E nem pode ter insatisfação porque nós tivemos 12 horas de discussão e de ampla defesa. Hoje foi construído pela Assembleia Legislativa, por todos os deputados que quiseram contribuir para o projeto. As emendas com consenso de todos entrou no substitutivo, as individuais tiveram apresentação em destaque.

CMT: O pacote fiscal foi aprovado pela legislação anterior com ampla maioria. Quem entrou reclamou que era para ter esperado a atual legislativa, e todos os projetos do governo foram aprovados com número de votos semelhante ao do pacote. Os novatos mudaram de ideia?

DDB: A legitimidade da legislatura passada venceu em 31 de janeiro de 2019. Eu estava na legislatura passada e tive a prerrogativa legal de votar qualquer matéria. O projeto do pacote foi apresentado em janeiro. Veio a nova legislatura e viu que os projetos são discutidos em quatro oportunidades, daí começaram a entender o por que daquele procedimento. Foi construído um entendimento da Assembleia Legislativa com o governo do Estado para que esse produto pudesse ser bom para alguma atividade. A nova legislatura, principalmente alguns que não foram legisladores ainda, começou a entender que o projeto que vem pra cá não é do Mauro, é do Estado.  Praticamente, quase a totalidade de votos que tivemos no governo passado, estamos tendo no governo de Mauro Mendes.

CMT: Na última semana da discussão dos incentivos saiu o boato de que o governo estava tirando o senhor da liderança. Teve alguma verdade no boato?

DDB: Eu sou um pequeno empresário em Mato Grosso e tenho virtudes, tenho princípios. Eu trabalho sempre no meu caminho. Se você me pedir que leve um carro daqui a Rondonópolis, eu não vou desviar. Eu tenho o compromisso de estar líder do governo e buscar equilíbrio. Quando o governo mandou a mensagem ele deixou claro que seria discutido dentro do parlamento. Eu tive responsabilidade de não deixar o projeto ser desconfigurado e de atender os deputados e os segmentos produtivos. Eu tive que trazer a discussão pra perto. Eu fiz isso, trouxe todos os segmentos para discutir e nunca individualmente. Teve vez no meu gabinete de haver 14, 15 deputados. No resumo praticamente da lei, a imprensa inteira começou a colocar numa situação dessa [de saída da liderança]. Tiver que ter equilíbrio de escutar, permanecer no meu jeito.  Não podia fazer isso ou fazer aquilo, mesmo não tendo nenhuma conversa do governo comigo sobre isso; nem da Casa Civil e de nenhum secretário. Não sei de onde apareceu. Conduzi a articulação até às 7h15 do sábado.

CMT: O governador chegou cobrar uma postura mais firme para defender o projeto original?

DDB: O governo pensava entrar uma roupagem de maior arrecadação. Agora, tínhamos que entender que a Assembleia iria discutir, ela queria participar do projeto. Não teve uma modificação brusca ao projeto.

CMT: O senhor foi líder do Pedro Taques, que tentou fazer uma reforma na cobrança do ICMS via o decreto 380. A mudança ser aprovada neste ano deve-se a qualidade do Mauro Mendes ou Taques não soube negociar?

DDB: O governador Pedro Taques, lá em 2015, poderia ter feito diferente. Ele tinha base forte na Assembleia e poderia ter trazido a proposta à base. Se o Taques tivesse trabalhado, elaborado com todos os setores para achar um encaminhamento para mudar o regime tributário, ele teria sucesso. No final de 2018, o governo colocou num projeto de lei, no artigo 14º, a proposta de mudança de regime tributário. Por decreto, ela dava autonomia ao secretário de Fazenda de fazer toda a mudança, e nós não aceitamos. Eu fui um dos deputados que fez de tudo para segurar o projeto. O Mauro não tinha outro caminho, falar “eu não vou fazer”.

CMT: O senhor disse este ano que avisou o Taques sobre a situação do Estado; recentemente ele admitiu que cometeu erros. O ex-governador era ruim de conversa?

DDB: O problema no governo Pedro Taques foi que muitos secretários estavam fazendo suas atividades como pré-candidatos. Acho que é preciso fazer uma análise dessa questão. Se começa a fazer coisas dentro de secretarias que se entendem como boas ações, mas não se entende a questão financeira. Na família, em vários momentos meus pais queriam comprar maça, mas não tinha dinheiro, tínhamos que comer o mingau que tinha em casa.  E quantas vezes vi minha mãe passando fome.  Sou de uma família de quatro filhos.  Tem que fazer opção, tem que priorizar. A questão financeira tem que mesclar com gestão.  [No governo Taques] tiveram ordem de serviço, ou avançou em obras sem ter lastro financeiro. Faltou um pouco disse e faltou ficar com a rédea mais curta e mais firme.

CMT: Onde o Taques soltou as rédeas?

DDB: Foi em muitas coisas…

CMT: O pagamento dos direitos salariais que o Silval Barbosa aprovou?

DDB: Também. Acho que era o momento mais feliz dentro do governo, de dificuldades, o governador, tendo sido o procurador da República que foi, ter partido pra cima dessas situações. Um reajuste de Revisão Geral Anual (RGA) – não que não fosse direito – de 11,28%, promovido em 2015, ele veio com um débito muito grande para o Estado. O Estado não pode viver só em função da máquina publica. Temos que saber que lá Aripuanã tem pessoa que quer qualidade na saúde, que quer estrada, rodovia.

CMT: A previdência é próximo grande debate no Estado?

DDB: Eu vejo que o Senado tem que ser muito inteligente, ter maturidade. Falei ao senador Jayme Campos (DEM) da inclusão dos Estados e municípios no projeto que está sendo aprovado. Não podemos mais viver nesta situação. O bolo da previdência no Estado é uma parte o governo e outra o servidor. São elas que têm que pagar. Outra pessoa que não é servidor público não tem nada a ver com esse processo. Hoje, está faltando no setor da previdência do Estado R$ 1,3 bilhão. Para cobrir esse bilhão, temos que arrecadar de ICMS R$ 2,2 bilhões, porque 25% do guarda-chuva do Estado são para os municípios. Se está faltando dinheiro para pagar aposentado e pensionista que se aumente a contribuição de cada um. O trabalhador comum não pode viver pagando o privilégio do servidor.

CMT: Se os Estados ficarem de fora, o senhor acha que o Mauro Mendes vai ter fôlego para aprovar uma reforma?

DDB: Vai ter que aprovar. Em 2023, nós devemos chegar ao déficit de R$ 4 bilhões. Será que contribuinte de Mato Grosso vai aceitar aumentar a arrecadação?  O povo foi pra rua por mudanças, nós queremos dinheiro para melhorar educação, segurança, saúde. Hoje, tem que ter dinheiro sobrando para dar resultado e entregar serviço à sociedade.

Redação

About Author

Reportagens realizada pelos colaboradores, em conjunto, ou com assessorias de imprensa.

Você também pode se interessar

Política

Lista de 164 entidades impedidas de assinar convênios com o governo

Incluídas no Cadastro de Entidades Privadas sem Fins Lucrativos Impedidas (Cepim), elas estão proibidas de assinar novos convênios ou termos
Política

PSDB gasta R$ 250 mil em sistema para votação

O esquema –com dados criptografados, senhas de segurança e núcleos de apoio técnico com 12 agentes espalhados pelas quatro regiões