A TransNambiquara é o nome de uma estrada que atravessa a Terra Indígena Nambiquara, Mato Grosso. O nome foi dado por Jacutinga, o indigenista que há cerca de 40 anos trabalha com os povos indígenas. A aposentadoria não significou seu afastamento da luta incansável contra o esmagamento de povos e saberes milenares.
Em fins de 1970, na região Nambiquara, Jacutinga assustou-se com os males que a BR 364 já causava aos índios. Ficou sentido de ver a estrada tornar-se um atrativo às gentes que têm por princípio não acumular bens materiais. A TransNambiquara foi fruto de inúmeras discussões com a comunidade e levou anos para ser concluída. Seu percurso deve ter aproximadamente 450 quilômetros. Do sul do território Nambiquara, passa pela aldeia Treze de Maio à aldeia Branca. Daí, um ramal vai ao rio Juína, cobiçado por PCH, a atormentar os espíritos que nessas águas verdes vivem.
Da aldeia Branca, segue para a Sapezal. Nesse ponto a estrada se bifurca: de um lado segue para as aldeias Barro Branco e Boqueirão, até o Porto Cachoeira, lugar de pesca; de outro, travessa o córrego Água Bonita e segue para as aldeias Funilão, Vista Alegre, Barranco Vermelho e Água Verde até alcançar a aldeia Barracão Queimado. Um mundo inimaginável de água potável, límpida a refletir os verdes das matas ciliares.
E a TransNambiquara prossegue sinuosamente, a deixar vivas as árvores maiores, passando por uma ponte sobre o córrego Macaco Preto até à aldeia “Sete Estrelo”. O riscado do plano rodoviário deveria encontrar a estrada que dá acesso à aldeia Camararé, mas ficou inacabado. Da aleia Barracão Queimado, foi recuperada a estrada para a aldeia Camararé, de lá abre-se para o Porto do Canguru, na beira do rio Juína. Da aldeia Camararé, um ramal chega à Montanha de Pedra, lugar mítico de seres sobrenaturais. Outro ramal, não concluído, seguiria às antigas aldeias 20 e Urutau.
Da aldeia Camararé, a estrada atravessa os rios Camararé, Mutum e Nambiquara até Campos Novos. Ao atravessar o rio Mutum, continua até à cachoeira do Mutum. De Campos Novos, até ao rio 12 de Outubro e ao Patuazal, espécie frutífera nativa que cobre uma grande extensão de terra às suas margens.
O traçado inicial da TransNambiquara, riscado durante tantas e tantas conversas, chega à aldeia Aroeira, na Terra Indígena Pirineus de Souza, à espera de uma ponte.
A TransNambiquara não conseguiu embaçar os olhos dos índios às cores e formas ilusórias e enganosas do mundo dos não índios.