Parece que foi ontem. Foi uma madrugada muito sofrida para meu velho. Respirava com muita dificuldade. Lembro bem do médico do Home care que veio à tarde:
– Pelo visto o senhor está escondendo dor.
– Que nada doutor.
Despistou enquanto assinava os papéis da empresa a qual trabalhava. Despachava todo dia de casa. Não perdeu cabelo. Não perdeu a dignidade. Assim era meu pai, o Seu João. Fez a passagem do jeito que sempre quis. Com a casa cheia, todos dormindo na sua casa. Parecia que a gente estava adivinhando. E estava mesmo. O câncer é uma doença que vai exterminando aos poucos. Engraçado que quanto mais o tempo passa, mais aumenta a minha admiração por ele. Aliás, que herói. Pessoas como ele não existem por esses dias. Ajudou a todos que conhecia, do jeito dele. Ah que falta ele me faz. Demorei tantos anos para entender o que ele era, representava, do que ele ensinava. Hoje sinto muita falta da pele, do toque, e principalmente, do cheiro. A como faz falta esse cheiro. Os 3 anos que viram 3 décadas que parecem 3 longos dias. A gente perde tanto tempo com besteira. A vida vale tanto. Pena que a gente demora tanto pra entender isso. O que vale mesmo são as pequenas coisas.
– Papaeeeeeeeee
Rompe sala adentro correndo meu caçula Francisco. Meu coroa não conheceu. Cara da minha parte da minha família alemã. Teimoso como todo alemão tem que ser. Briguento como todo alemão é. Inteligente que só ele. Deve estar lá em cima orgulhoso:
– É oreia, achou que ia ser moleza, né.