A defesa do cabo Gerson Corrêa, réu ao lado de outros quatro oficiais-PM no escândalo das escutas ilegais do ex-chefe da Casa Civil Paulo Taques, arrolou quatro novas testemunhas, entre elas, a juíza Selma de Arruda e a delegada Alana Cardoso. As duas “substituíam” o governador Pedro Taques por vontade da banca de advogados e foram ouvidas até o fim da tarde desta segunda-feira (26) no Fórum de Cuiabá.
As revelações foram Alana dizer que se sentia acuada, “perplexa” e “chocada” com o que fizeram com o nome dela no decorrer das investigações e admitir que escutou sim conversas de celular de Tatiane Sangalli Padilha e Caroline Mariane dos Santos, quando era diretora geral de Inteligência da Polícia Civil de Mato Grosso.
Sangalli Padilha (nas escutas, Dona Loira) seria suposta ex-amante de Paulo Taques e Mariane dos Santos (nomeada Amiguinha), assessora do último, mas os motivos alegados por ela para proceder ao grampo, a pedido de outro delegado Flávio Stringueta, então diretor do Grupo de Combate ao Crime Organizado (GCCO), seria verificar um possível plano para “pôr em risco a vida ou a honra” do governador Pedro Taques (PSDB), numa trama que envolveria Sangalli e o João Arcanjo Ribeiro, condenado por homicídio e por chefiar o jogo iletal em Mato Grosso.
“Os indícios pareciam reais, Pedro Taques era governador há menos de um ano [os grampos admitidos por ela aconteceram entre fevereiro e abril de 2015] e era minha atribuição, como diretora-geral da inteligência da Polícia Civil, verificar qualquer ação nesse sentido”, disse Alana. Ela também justificou o ato, além da investigação policial pura e simples, como derivado de preocupações extra, como o fato de Taques colocar-se como governo de renovação e a busca por “integração” entre as forças de segurança pública, a saber, Polícia Militar, Polícia Civil, Corpo de Bombeiros e agentes prisionais.
Essas preocupações tinham base real no âmbito do que já era desenvolvido na Operação Forti, cujo principal objetivo era investigar e frear as ações das facções criminosas Primeiro Comando da Capital (PCC) e Comando Vermelho (CV), explicou Cardoso. Ela contou à corte coordenada pelo juiz Murilo Moura Mesquita, da 11ª Vara de Justiça Criminal, Ministério Público e juízes militares, que a suspeita inicial aventada por Stringueta era de que Sangalli tinha por objetivo envolver-se com Arcanjo e juntos tramarem algo contra Taques.
Coisas que naquele momento, frisou a delegada, parecia fazer muito sentido, dado o nível de atuação e alcance das facções no Estado. “Não foi uma coisa inventada por nós [investigadores de polícia]. Todo mundo está vendo como estão hoje as facções”. Entretanto, logo os setores de inteligência perceberam que não havia nada concreto no sentido de “colocar em risco a honra ou a moral do governador” e as escutas foram abandonadas, segundo disse Alana em depoimento.
Ela afirmou também que o serviço de inteligência anti-facções segue ainda hoje, mesmo que com outro nome, porém sempre sob coordenação do diretor-geral de inteligência da Polícia Civil. Para ela, a ideia de integração foi abraçada pelas forças policiais. “Era um momento muito democrático na Polícia Civil, foi a primeira vez que um diretor de inteligência foi eleito em votação”, disse, ao lembrar que seu nome foi colocado aos colegas porque o então diretor de inteligência, Gustavo Garcia, fora para o Rio de Janeiro, estudar na Escola de Guerra.
No desenrolar das investigações (a Forti virou Querubim), o esquema de grampos acabou revelado pelo ex-secretário de Segurança Pública Mauro Zaque e Alana Cardoso viu seu nome ser enredado por imprensa e opinião pública, quando a chamada “grampolândia pantaneira” veio à tona e ela foi “pega desprevenida” pela convocação do novo secretário Rogers Jarbas (ele substituiu Mauro Zaque), para que ela fosse à Secretaria de Segurança Pública, sem informar-lhe o motivo.
Isso só teria sido feito quando ela chegou ao gabinete dele, por meio de questionamentos quanto ao trato dela com Mauro Zaque quando este era o titular da Sesp. Para ela, Jarbas utilizou seu grau na hierarquia da segurança pública para obrigá-la a falar sobre um assunto de interesse direto dele e, a partir disso, violar seus direitos como profissional de polícia e investigação.
Foi quando ela decidiu escrever o documento pedindo socorro à Ordem dos Advogados do Brasil e ao Ministério Público e que acabou tornado público, via publicação na imprensa.
Até então, garante Alana, ela nunca tinha conversado com a também delegada Alessandra Saturnino, então adjunta de Inteligência, depois da saída dela, fora da Operação Forti. Somente depois que se sentiu atacada pela imprensa, em maio passado, ela teria procurado conversar com Saturnino para juntas irem ter com Mauro Zaque. No entremeio, a juíza Selma Arruda havia redigido um ofício e enviado ao Executivo no qual ela e Zaque são citados.
“Fiquei tão chocada que fui perguntar a ele (Mauro Zaque) o que estava acontecendo, malhamos na mesma academia, mas ele me respondeu que também não sabia”, disse.
Também foi ouvida, além de Alana Cardoso e Selma Arruda, a ex-servidora Elizandra Rodrigues Darigon, que era analista de áudio na Sesp, durante o período em que as escutas aconteceram, e o investigador da Polícia Civil Rafael Meneguini.
A juíza disse que não sabia oficialmente que Tatiane Sangalli e Caroline Mariane dos Santos eram grampeadas e só teria tomado conhecimento disso por meio da imprensa.
O ofício feito por Selma Arruda e aludido por Alana Cardoso foi encaminhado à corregedora-geral de Justiça do Tribunal de Justiça, desembargadora Maria Aparecida Ribeiro. O documento tratava exatamente disso, o exercício de grampo ilegal por parte da delegada Alana Darlene Souza Cardoso.