Política

Muitos planos de governo para pouco dinheiro

Um relatório divulgado em novembro de 2016 pelo TCE (Tribunal de Contas do Estado) apontava pendência de R$ 59 milhões do Estado com as prefeituras no financiamento da saúde. O montante estava acumulado desde janeiro, e hoje, 12 meses decorridos da divulgação do relatório, o valor é quase o triplo e tende a encerrar 2017 nesse patamar. A contratação excessiva de policiais militares e o otimismo quanto à arrecadação podem explicar um pouco da crise enfrentada pelo Estado.

Ainda em novembro de 2016, o governador Pedro Taques anunciou a alteração no calendário de pagamentos de folha salarial dos servidores estaduais. A liquidação que vinha sendo feita até o último dia do mês vigente teve o prazo dilatado para o dia 10 do mês posterior. Há dois meses esta data começou a sofrer nova dilatação. O salário de setembro foi pago no dia 11 de outubro e o de outubro só teve a liquidação completada no dia 21 deste mês.

Os dois problemas têm uma fonte única: as contas do Estado aumentaram e a entrada de dinheiro em caixa para cobrir as despesas tem levado mais tempo. Falta aquilo que o governador gosta de chamar de “dinheiro novo”, as fontes alternativas aonde buscar mais dinheiro para sustentar a máquina estatal.

Além da crise econômica, a mais justificada pelo governo, as equipes econômica e de planejamento podem ter superestimado o quanto o Estado conseguiria arrecadar. O governo Pedro Taques foi responsável pela montagem orçamentária a partir de 2016, e a enfoque dado por Taques na mudança de perfil de aplicação de recursos em sua gestão contribuiu para inflar as despesas.

Dados a que a reportagem teve acesso mostram que durante o governo Silval Barbosa (PMDB), de meados de 2010 a 2014, a previsão orçamentária, que embasa a LOA (Lei Orçamentária Anual), oscilou na estimativa entre saldos negativos e positivos na comparação com a receita líquida auferida ao fim de cada período.

Em 2011, a receita que movimentou o caixa do Estado ficou em mais de R$ 550 milhões abaixo do estimado (-4,9%); no ano seguinte, a variação teve resultado positivo e ficou cerca de R$ 335 milhões acima da previsão (2,5%).

Em 2013, novamente foi registrado saldo negativo, dessa vez bem menor que o de 2011, um montante de R$ 97,8 milhões (-0,76%). Nos dois anos seguintes, ocorreram variações positivas. Em 2014 houve superávit de R$ 570 milhões (4,2%) e em 2015 de R$ 402 milhões (2,95%). Ainda assim, segundo a Seplan (Secretaria de Planejamento), Silval Barbosa encerrou seu mandato com restos a pagar de R$ 400 milhões.

A estratégia adotada pelas equipes financeiras de Silval Barbosa, lideradas em largo período por Eder Moraes, foi a de programar o orçamento com um limite máximo de variação, o que abria margem para os superávits registrados.

A das equipes de Pedro Taques foi de elevar a previsão orçamentária para o mais próximo possível do que foi considerado como prudencial e permitido por lei para possibilitar maior distribuição de recursos para áreas essenciais na estimativa orçamentária.

O primeiro ano de gestão com orçamento autoprogramado (2016) terminou com variação de 0,52% em recursos. Foi estimado um orçamento de R$ 16,553 bilhões para o realizado de R$ 16,638 bilhões. Já no segundo (2017), o rombo do governo está em R$ 1,9 bilhão no acumulado de janeiro a outubro, aponta o mais recente relatório divulgado pela Sefaz (Secretaria de Fazenda).

Taques errou na montagem de estratégia, diz analista

O analista político Onofre Ribeiro diz que pesa contra o governo Taques o aumento frequente na folha de salarial dos servidores públicos e falha no planejamento de gestão. Ele afirma que o crescimento econômico médio registrado em Mato Grosso nos últimos 15 anos (2003-2017), de 5,5%, esteve num patamar que possibilitou a destinação de recursos mais elástica para áreas essenciais. Mas a concessão de reajustes salariais em nível constante a partir do INPC (Índice Nacional de Preço ao Consumidor) na gestão Silval Barbosa foi mal calculada.

“No período do governo Silval Barbosa, a inflação estava baixa e o Estado crescia a 5,5% ao ano, um volume considerável de crescimento que conseguiria cobrir os gastos no nível da inflação no período. Com a crise, a inflação subiu e arrecadação caiu neste ano, aí a situação é inversa”, comenta.

Conforme o governador Pedro Taques, o pagamento dos aproximadamente 100 mil servidores estaduais consome 50% do orçamento anual de Mato Grosso.

O segundo erro foi cometido na própria gestão Pedro Taques. O analista afirma que houve “excesso de confiança” da equipe de planejamento na estimativa de arrecadação, o que possibilitou maior destinação para áreas essenciais (saúde, educação e segurança), as mesmas que mais reclamam de subfinanciamento público.

“Houve imaturidade do governo em avaliar o cenário, o que levou ao excesso de confiança naquilo que poderia ser arrecadado. E o mesmo com a aprovação do plano de contenção de gastos, o governo não vai conseguir colocar as contas em dia dentro do prazo estimado. Ainda haverá outras quatro gestões para organizar o Estado, se não houver outra crise”.

A PEC (Proposta de Emenda à Constituição) do Teto dos Gastos prevê suspensão de novos financiamentos nas áreas essenciais por um período de dez anos, a proibição de concursos públicos, e contenção na aplicação de progressão de carreiras dos servidores. Essas áreas receberiam reajustes financeiros pela base na ponderação da inflação do ano anterior a partir de 2018.

Esse plano de contenção, segundo governo, possibilitaria reorganizar as contas públicas até meados de 2020 e geraria economia de R$ 1,3 bilhão para os cofres públicos já no primeiro ano de contenções. Para Onofre Ribeiro, o montante estimado pelo governo poderia ser alcançado no prazo mínimo de três anos: “Esse dinheiro que o governo diz que resultará de economia não existe. Pode conseguir R$ 300 milhões ao ano, disso se pode considerar quanto tempo se levará para alcançar o mais de R$ 1 bilhão”.

A Assembleia Legislativa deve encerrar a votação da proposta do Executivo no início de dezembro, tendo um substitutivo integral como o modelo principal do plano, com alterações em vários itens.

Superintendente diz que escolhas de gestão inflaram despesas

O superintendente de Receita e Estudo de Despesa da Seplan, Ricardo Capistrano, afirma que a estratégia orçamentária do governo cumpre a variação orçamentária prevista em lei, com limite prudencial de estimativa. Porém, admite que algumas escolhas contribuíram para o aumento das despesas.

“Em termos de prática orçamentária, o que é correto, legal, é que se faça estimativa da receita mais próximo possível, aceitando uma variação dentro de uma margem de erro. A Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) estabelece no mínimo três fatores para ser considerados: efeitos do preço, crescimento econômico e efeito legislação, que é: se houver mudança em regras, como isso vai afetar a arrecadação”.

Ele diz que a variação média da previsão orçamentária o orçamento realizado era de 3%, sendo o ideal é uma variação de 2% para cima ou para baixo. A variação no primeiro orçamento elaborado pela equipe de Pedro Taques foi de 0,52%.

Capistrano diz ainda que a estratégia de Silval possibilitou maior discricionariedade na distribuição do excesso da receita. Na prática, o ex-governador pôde distribuir recursos sem a necessidade de permissão de órgãos externos de controle fiscal.

“Ele poderia, por exemplo, distribuir mais recursos para os outros Poderes. Recurso que não estava previsto no orçamento inicial. Ou seja, houve escolhas sem levar em consideração questões técnicas”, explica.

Por outro lado, o superintendente afirma que Mato Grosso ainda teria dificuldades com o orçamento por causa de medidas tomadas pelo governo Pedro Taques. A de maior peso foi a de contratação de um número massivo de policiais militares desde o início de sua gestão: 3.500 novos policiais militares e civis e oficiais do Corpo de Bombeiros foram efetivados desde 2015.

O número representou aumento de 33% de cada corporação em pouco mais de um ano. Taques também fez investimento pesado no setor de inteligência. Conforme ele, ao assumir o governo, o setor de Inteligência de Segurança Pública (Sesp) tinha R$ 127 mil para financiamento, valor que subiu para R$ 13 milhões em 2015. Os números são da assessoria do governo.

“Acredito que se o governo tivesse segurado um pouco no número de contratação de policiais, o momento financeiro atual seria menos grave. Esse foi o setor que mais representou aumento de despesas, junto com a folha de salários. Mas foi uma escolha do governo Taques, que tinha esse enfoque”, diz Capistrano.

O governador Pedro Taques também deverá planejar para orçamento de seu último ano de mandato a garantia de fontes para a quitação de restos a pagar, que deve ser de R$ 600 milhões até o fim de 2018, ou seja, 200 milhões a mais que a recebida do governo Silval Barbosa.

A reportagem procurou representantes do Fórum Sindical para comentar os dados, mas não houve retorno até o fechamento desta edição.

Redação

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Reportagens realizada pelos colaboradores, em conjunto, ou com assessorias de imprensa.

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