O Pleno do Tribunal de Contas de Mato Grosso, em decisão histórica, em processo de reexame de tese prejulgada, mudou seu entendimento sobre a legalidade dos entes públicos contratarem serviços de divulgação de utilidade pública junto a rádios comunitárias do Estado. Com o novo entendimento, o Tribunal passa a considerar como legal o pagamento pela veiculação de anúncios de utilidade pública nas emissoras comunitárias de radiodifusão instaladas em território mato-grossense.
Os conselheiros acolheram em sua unanimidade o voto do relator, conselheiro Valter Albano, emitido no processo nº 23.116-9/2017, originado pelo pedido de reexame de tese feito pelo presidente da Corte de Contas, Antonio Joaquim Moraes Neto, com o objetivo de revisar a Resolução de Consulta 36/2009 – TCE/MT feita pela Prefeitura Municipal de Juína.
Até o momento, a tese vigente na Corte de Contas era a de não possibilidade de participação de rádio comunitária em processo de licitação, e o impedimento de receber contraprestação pecuniária pela transmissão de comunicação institucional.
Em seu voto, o conselheiro Valter Albano citou o fato da Lei nº 4.320/64, em seus artigos 12 e 16, legitimarem a concessão de subvenções sociais por parte dos entes públicos às rádios comunitárias que atendam as exigências da legislação que regulamenta as mesmas. “É lícito ao ente público municipal conceder apoio cultural, na forma de subvenção social, às fundações e associações comunitárias, sem fins lucrativos, que exploram o Serviço de Radiodifusão Comunitária, desde que legalmente instituídas na forma da Lei 9.612/98”, considerou o relator.
A nova resolução do TCE-MT estabelece crítérios para que as rádios comunitárias possam receber subvenções dos entes públicos, que exigirão que estas se adaptem às regras legais. Para tanto, a subvenção social deverá atender as condições estabelecidas na lei de diretrizes orçamentárias, com previsão no orçamento público, ou em seus créditos adicionais.
A norma estabelece ainda que o apoio cultural deverá ser formalizado por meio de convênio, acordo, ajuste ou instrumento congênere, obedecendo ao disposto no parágrafo único do artigo 16 e no artigo 17, da Lei 4.320/64. O objeto a ser executado deverá ainda ser especificado de forma clara e correta, de acordo com um plano de trabalho que estabeleça as condições mínimas de execução e o valor calculado com base em unidade de serviços efetivamente prestados ou postos à disposição do ente contratante.
Outra condição estabelecida na nova resolução do TCE-MT sobre o tema é que, caso exista na localidade mais de uma rádio comunitária, o Poder Público deverá fazer o credenciamento de todas que satisfaçam as condições fixadas em lei, garantindo igualdade de condições às interessadas. Tembém a rádio comunitária não pode ser considerada como órgão de imprensa oficial a dar validade aos atos da administração e deverá prestar contas dos recursos recebidos ao órgão concedente, que manterá os documentos arquivados e disponíveis para eventual fiscalização pela Corte de Contas.
Para o diretor financeiro da Associação Brasileira de Rádios Comunitárias – Seção de Mato Grosso, Aberides Alves da Silva, também coordenador da Rádio Comunitária Alternativa de Várzea Grande, a resolução do Tribunal de Contas veio fazer justiça para com o segmento. Aberides Alves destacou que as emissoras comunitárias de rádio exercem um papel fundamental nas comunidades em que estão instaladas, sendo canais acessíveis e espaço democrático de difusão de informação e cultura, bem como tribunas de defesa dos interesses da população local, mas que eram tratadas como veículos de comunicação marginais, de segunda classe.
“As rádios comunitárias são essencialmente prestadoras de serviços de utilidade e interesse público, mas que são limitadas em sua captação financeira. Com este novo entendimento, poderemos enfim ser remuneradas na prestação de serviços de utilidade pública para as prefeituras, para o estado ou outros órgãos públicos. Com isso poderemos ter um fluxo financeiro que nos permita melhorar os equipamentos, contratar técnicos para manutenção e custear o funcionamento das emissoras”, argumenta.
Já o veterano radialista Jurandir Antonio, do Escritório do Rádio, militante pioneiro no movimento das rádios comunitárias de Mato Grosso, considerou a decisão do TCE-MT “histórica e um divisor de águas” para o segmento. “O TCE acaba de fazer justiça às rádios comunitárias, reconhecendo seu papel importante para as comunidades em que estão inseridas e como veículos legais para a difusão de informações de utilidade pública”, frisou.
O radialista destacou que este reconhecimento era uma luta antiga das emissoras comunitárias de rádio em Mato Grosso e que a resolução da Corte de Contas será uma referência para o resto do país. “É um avanço extraordinário para o setor. Com certeza será modelo para o país inteiro, contribuindo para o fim da marginalização não só das rádios de Mato Grosso, mas também das de todo o Brasil, pois será replicada em outros estados. É um momento histórico e uma grande vitória do nosso segmento”, disse Jurandir Antonio.