O investigado Marcos Moreno Miranda, dono da empresa 3M, apontou a eventual participação de um deputado estadual e um diretor do Tribunal de Contas do Estado (TCE-MT) no esquema envolvendo a Faesp (Fundação de Apoio ao Ensino Superior Público Estadual), que teria desviado mais de R$ 3 milhões de órgãos públicos nos anos de 2015 e 2016.
A declaração consta no depoimento prestado por Marcos Miranda ao Grupo de Atuação Especial Contra o Crime Organizado (Gaeco), em 21 de junho, um dia após a deflagração da Operação Convescote. Aos promotores de Justiça, ele confessou ter atuado como "laranja", abrindo uma empresa "fastasma" para lavagem de dinheiro público.
De acordo com Marcos Miranda, que cumpre prisão domiciliar, a suposta participação de um parlamentar e diretor do TCE-MT, que davam “segurança” para a continuidade das falcatruas, foi revelada por Cláudio Roberto Borges Sassioto, servidor terceirizado do TCE-MT e apontado pelo Gaeco como sendo um dos articuladores do esquema criminoso.
Segundo o investigado, ele conheceu Cláudio Sassioto em 2009 em um pesqueiro no município de Santo Antônio do Leveger.
“Cláudio Sassioto dizia que trabalhava no TCE-MT e que, pelo fato de já estar lá há muito tempo, teria influências para arrumar um emprego para mim. No ano de 2010, ele solicitou que eu fizesse alguns cursos técnicos de informática e administração para que ficasse habilitado para assumir um cargo junto ao TCE-MT, ressaltando que isso ocorreria assim que o conselheiro Carlos Noveli assumisse a presidência do órgão”, disse em seu depoimento.
Conforme Marcos Miranda, logo que Noveli assumiu a presidência, Cláudio Sassioto começou a dar desculpas, dizendo que ele não teria condições “psicológicas e de saúde” para assumir tal cargo.
Em 2016, após continuar dando esperanças de que conseguiria um emprego ao investigado, o servidor do TCE-MT, segundo o depoimento, convidou Marcos Miranda para ir até sua casa no Residencial Solar da Chapada, em Cuiabá.
“Ocasião em que Cláudio Sassioto disse que existia um ‘fundo perdido’ do Governo e que teria condições de me ajudar a receber uma ajuda financeira, dizendo ainda que já tinha feito isso para outras pessoas há mais de dois anos e que não daria qualquer tipo de problema”, declarou.
Retorno de 15%
Foi então que, segundo o depoimento, Cláudio Sassioto orientou Marcos Miranda a abrir uma empresa em seu nome na modalidade MEI (Microempreendedor Individual), cujo faturamento seria até o limite de R$ 60 mil anual.
“Sassioto ainda disse que a empresa deveria ser sediada em minha residência e que posteriormente um fiscal da Prefeitura iria fazer uma vistoria e entrevista. Sendo que todas as despesas para a abertura dessa empresa seriam por ele custeadas”, afirmou.
Na ocasião, conforme Marcos Miranda, Cláudio Sassioto disse que em contrapartida pagaria 15% do valor faturado em relação a essa empresa.
“De fato, Cláudio Sassioto pagou todas as despesas referentes a abertura da empresa. Após ele constatar que já estava construída, mudou a proposta inicial, dizendo que não seria mais os 15% sobre o valor faturado, pois 5% seriam para impostos, e outros 10% deveria ser dividido entre nós.
Marcos Miranda declarou que a empresa foi aberta em fevereiro de 2016 e que, acompanhado de Cláudio Sassioto, foi até a agência do Banco Sicoob, localizada no interior do TCE-MT, em Cuiabá, para abrir uma conta corrente em nome da empresa.
No depoimento, o investigado afirmou que em abril de 2016 recebeu o primeiro montante de dinheiro depositado pela Faesp, no entanto, não se recorda do valor.
Após o dinheiro ser depositado, segundo Marcos Miranda, Cláudio Sassioto entrou em contato solicitando que ele fosse até o TCE-MT, para que sacassem o dinheiro na agência do Sicoob juntos.
“Sacamos na ‘boca do caixa’ a importância disponível, sendo que o restante foi preciso falar com uma tal de ‘Bete’ – uma mulher alta, magra, cabelos loiros, olhos claros, aparentando de 30 a 35 anos de idade -, que dizia ser a gerente da agência”, relatou.
Conforme o investigado, Cládio Sassioto pediu para ele deixar assinado uma ordem de saque com o valor em branco, para que, posteriormente, ele sacasse o restante do dinheiro.
“Outras vezes eu transferia diretamente da minha conta corrente para a conta corrente de Cláudio. Em outras vezes, eu deixava com a tal ‘Bete’, ordens de saque em branco assinadas para que, posteriormente, Cláduio fizesse o saque do saldo remanescente”, declarou.
Deputado e diretor
No depoimento, o investigado detalhou que a ordem de prioridade de saque era da seguinte forma: “saque em espécie, transferência bancária para Cláudio Sassioto e assinatura de ordem de saque em branco”.
Marcos Miranda disse que por cada transação ele recebia cerca de R$ 300 a R$ 400. No total, acredita ter recebido o montante de R$ 3 mil durante todo este período.
“Não sei dizer se os depósitos eram feitos pela Faesp ou por outros órgãos, já que toda a parte de emissão de nota fiscal e outros documentos eram realizados pelo próprio Cláudio”, declarou.
Ainda ao Gaeco, o investigado afirmou que a sua empresa não prestou serviços para a Faesp ou qualquer órgão público.
“Apenas assinava os diversos documentos a pedido de Cláudio e por isso não sei dizer qual o valor exato que minha empresa teria recebido. Não sei dizer se Cláudio teria alguém a quem repassava esse dinheiro, mas ele dizia sempre que existiam pessoas muito poderosas que ‘estavam por trás disso e que dariam toda segurança’. Inclusive, dizia que havia um deputado e um diretor do TCE-MT, mas não mencionou o nome deles”, observou.
Cargo com deputado
Em seu depoimento, Marcos Miranda ainda afirmou que em dezembro de 2016 Cláudio Sassioto o procurou dizendo que teria conseguido um cargo na Assembleia Legislativa com um deputado, mas não informou o nome do parlamentar.
O emprego, segundo o investigado, seria uma forma de lhe ajudar, uma vez que Cláudio Sassioto não teria conseguido o cargo no TCE-MT.
“Fui contratado pela Assembleia Legislativa em dezembro de 2016. No entanto, só compareci efetivamente para trabalhar em meados de janeiro de 2017 e lá permaneci até o final do mês de março na Superintendência de Licitações, onde parte da equipe executiva de cotação de preços”, disse.
Conforme Marcos Miranda, a contratação foi por meio do convênio da Assembleia Legislativa e a Faesp assinado em 2015 e que prevê o pagamento de R$ 100 milhões à fundação até 2019.
“Recebi apenas um salário no final do mês de dezembro de 2016, sendo que o valor bruto era de R$ 6.671,00, e líquido R$ 4.931,17”, afirmou.
O investigado disse ainda que, por determinação de Cláudio Sassioto, sacou o valor e entregou nas mãos dele. Cláudio teria repassado apenas a quantia de R$ 1,2 mil, alegando que o restante ficou para o pagamento de impostos de outra empresa, em nome de João Paulo Silva Queiroz.
Quebra de sigilo fiscal
Na investigação, o Gaeco revelou o resultado da quebra de sigilo fiscal das contas da empresa de Marcos Miranda, a 3M.
De acordo com o relatório, a conta no Sicoob foi aberta no dia 6 de abril de 2016 e que oito dias após foi creditado a importância de R$ 21 mil provenientes da Faesp.
“Detectamos que a conta pessoa jurídica de Marcos Moreno teve apenas a Fundação de Apoio ao Ensino Superior Público Estadual — Faesp como fonte de recursos, sendo que mais da metade destes recursos foi transferida para o investigado Cláudio Sassioto”, afirmou o Gaeco.
A operação
A organização criminosa supostamente formada por empresários, servidores públicos e funcionários da Fundação de Apoio ao Ensino Superior Público Estadual (Faesp), desviou mais de R$ 3 milhões dos cofres públicos entre os anos de 2015 e 2016.
O apontamento foi feito pelo Grupo de Atuação Especial Contra o Crime Organizado (Gaeco), que no último dia 20 deflagrou a Operação Convescote, que prendeu preventivamente onze pessoas.
De acordo com o Gaeco, o desvio teve origem, principalmente, dos cofres da Assembleia Legislativa e Tribunal de Contas do Estado (TCE-MT), que firmaram convênio de prestação de serviços com a Faesp.
Outros desvios foram realizados em convênios firmados com a Secretaria de Estado de Infraestrutura e Logística (Sinfra) e a Prefeitura Municipal de Rondonópolis.
De acordo com o Gaeco, o esquema funcionava da seguinte maneira: instituições públicas firmavam convênios com a Faesp para prestação de serviços de apoio administrativo. A Fundação, por sua vez, contratava empresas de fachadas para terceirização de tais serviços. Ao final, os recursos obtidos eram divididos entre os envolvidos, sendo que o responsável pela empresa normalmente ficava com uma pequena porcentagem do montante recebido e o restante era dividido entre funcionários da fundação e servidores do TCE.
Tiveram a prisão preventiva decretada: Claudio Roberto Borges Sassioto, Marcos Moreno Miranda, Luiz Benvenuti Castelo Branco de Oliveira, Jose Carias da Silva Neto Neto, Karinny Emanuelle Campos Muzzi de Oliveira, João Paulo Silva Queiroz, José Antônio Pita Sassioto, Hallan Goncalves de Freitas, Marcos Jose da Silva, Jocilene Rodrigues de Assunção e Eder Gomes de Moura.
Karinny Emanuelle Campos Muzzi de Oliveira, Jocilene Rodrigues de Assunção e Marcos Moreno Miranda tiveram suas prisões preventivas convertidas em prisão domiciliar.
João Paulo Silva Queiroz teve soltura decretada.
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