A Associação Mato-grossense do Ministério Público (AMMP) classificou como levianas as declarações do ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), que apontou um “festival de abusos” cometidos pelos órgãos de investigação no País.
Nesta terça-feira (20), durante seminário no instituto Brasileiro de Direito Público, do qual é sócio, Mendes disse que, no combate ao crime, não se deve cometer outro crime, e criticou o Ministério Público, citando o órgão em Mato Grosso, quanto ao escândalo dos grampos telefônicos, por meio da tática conhecida como “barriga de aluguel” – em que números de telefones de pessoas comuns são inseridos em pedidos judiciais de quebra de sigilo, sem qualquer relação com investigações.
“Ainda neste final de semana, estive em Mato Grosso, e de lá dei-me com notícias de que há um festival de abusos feitos no âmbito de investigação, e essa notícia infelizmente se repete Brasil afora, feita pelo Ministério Público. A chamada barriga de aluguel, uso de interceptação telefônica para atingir adversários políticos ou até pessoas nas relações privadas”, discursou Gilmar, completando que isso se deve à "falta de controle" do modelo de investigações, e defendeu aprofundamento do tema.
Por meio de nota, o presidente da AMMP, promotor de Justiça Roberto Turin, repudiou a declaração.
“Visando a criticar supostos abusos ocorridos em investigações criminais no País, de maneira leviana e irresponsável, o Ministro citou como exemplo o envolvimento fantasioso do Ministério Público de Mato Grosso no esquema de interceptações telefônicas fraudulento denominado 'barriga de aluguel'”, diz trecho da nota.
Turin disse que a colocação de Mendes é inadequada, por conta do cargo que ocupa.
“A forma e o conteúdo das afirmações foram inteiramente inadequados para ocupante de cargo na magistratura, onde o modelo de conduta esperado por todos é o da serenidade, prudência, moderação, confiabilidade e certeza do que diz; nunca o da especulação, da falácia, do boato infundado e do insulto caviloso”, declarou.
O presidente da AMMP ressaltou que as supostas interceptações telefônicas de políticos, médicos, advogados e até jornalistas foram denunciadas por um membro do MPE, o promotor de Justiça Mauro Zaque.
A investigação é feita pela Procuradoria-Geral da República (PGR).
“A AMMP mantém-se firme na defesa das liberdades individuais e do Estado de Direito e não admitirá, jamais, ataques infundados e desnecessários de quem quer seja, registrando ainda que irá buscar os meios legais para obter a retratação ou aplicação das sanções cabíveis em decorrências das afirmações falsas do citado Ministro, especialmente porque proferidas em evento jurídico e disseminadas pela imprensa nacional, o que agrava o dano causado aos seus associados”, pontuou.
Investigação
Por determinação do desembargador Orlando Perri, do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJ-MT), o procurador-geral de Justiça de Mato Grosso, procurador Mauro Curvo, deu início a investigação de suposta participação de membros do MPE nas irregularidades.
A decisão levou em consideração notícia-crime apresentada pela OAB-MT, que, segundo o presidente Leonardo Campos, recebeu informações da existência de interceptações telefônicas e fiscais ilegais em investigações sob responsabilidade de membros do MPE.
As interceptações telefônicas ilegais envolveriam o ex-governador Silval Barbosa (PMDB) e seus três filhos, no âmbito da Operação Ouro de Tolo (2ª fase da Operação Arqueiro), que investiga a ex-primeira dama, Roseli Barbosa.
Já a quebra de sigilo fiscal teria sido cometida no âmbito da Operação Sodoma, que tem o ex-governador do PMDB como um dos réus.
Confira a nota de repúdio na íntegra:
“Nota de Repúdio
A AMMP – Associação Mato-grossense do Ministério Público, entidade de classe de Promotores e Procuradores de Justiça vem a público manifestar seu veemente repúdio às declarações do Ministro do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes, feitas ontem, dia 20 de junho de 2017, na abertura do 7º Seminário Internacional de Direito Administrativo e Administração Pública, promovido pelo Instituto Brasiliense de Direito Público (IDP) e transcritas em reportagem do jornal O Estado de São Paulo.
Visando a criticar supostos abusos ocorridos em investigações criminais no país, de maneira leviana e irresponsável, o Ministro citou como exemplo o envolvimento fantasioso do Ministério Público de Mato Grosso no esquema de interceptações telefônicas fraudulento denominado “barriga de aluguel”.
A forma e o conteúdo das afirmações foram inteiramente inadequados para ocupante de cargo na magistratura, onde o modelo de conduta esperado por todos é o da serenidade, prudência, moderação, confiabilidade e certeza do que diz; nunca o da especulação, da falácia, do boato infundado e do insulto caviloso.
As vísceras do esquema de interceptações ilícitas perpetrado para vigiar políticos opositores e bisbilhotar a relação privada dos cidadãos mato-grossenses, neste momento em fase de investigação, foram expostas a partir de denúncia de próprio integrante do Ministério Público, instituição que possui o compromisso indissolúvel com as garantias e conquistas democráticas e com o fortalecimento das instituições públicas.
A AMMP mantém-se firme na defesa das liberdades individuais e do Estado de Direito e não admitirá, jamais, ataques infundados e desnecessários de quem quer seja, registrando ainda que irá buscar os meios legais para obter a retratação ou aplicação das sanções cabíveis em decorrências das afirmações falsas do citado Ministro, especialmente porque proferidas em evento jurídico e disseminadas pela imprensa nacional, o que agrava o dano causado aos seus associados.
Cuiabá, 21 de junho de 2017.
Direção da AMMP”
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