Política

A Seduc está vivendo uma nova era, afirma secretário de Educação

Quando assumiu o comando da Secretaria de Educação em fins de maio de 2016, o advogado Marco Marrafon assumiu problemas internos e externos. Ele foi transferido às pressas, da Secretaria de Planejamento, para substituir Permínio Pinto, que havia renunciado ao cargo por investigação a esquema que teria desviado até R$ 500 milhões dos cofres públicos, com a participação de empreiteiras e empresários, do próprio então secretário, além de servidores de vários escalões – somado a isso há o histórico de desmando e fraudes em mais de treze anos de existência da pasta. Do lado de fora, professores participavam de greve geral de cobrança pela RGA (Revisão Geral Anual) e alunos ocupavam escolas contra a divulgação da proposta de parceria público-privada. Hoje, quase um ano depois, ele diz que a Seduc começa a destravar suas ações após um “forte programa de ética e de combate à corrupção”. Nesse ínterim, ele adotou a ambiciosa meta de colocar o ensino médio de Mato Grosso, que tem apresentado quedas no Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica) dentre os dez melhores do país até 2018, um objetivo que não depende só da Seduc, e também tenta dialogar com professores, que reclamam de situação precária. Em entrevista ao Circuito Mato Grosso, o secretário fez um balanço de seu trabalho e apontou os programas Pró-Escolas e Arena da Educação como carros-chefes da reversão do quadro ruim da educação pública em Mato Grosso.   

Circuito Mato Grosso: Pode-se dizer que você está às vésperas de completar um ano como secretário de Educação. Já dá para fazer um balanço?

Marco Marrafon: São dez meses de gestão. A gente teve um momento muito difícil no início, estava iniciando as ocupações das escolas, chegamos até 22 escolas ocupadas, um clima muito difícil de desmotivação geral dentro da secretaria e em toda a rede. A necessidade das respostas rápidas em relação ao escândalo de corrupção que ocorreu, infelizmente. A partir desse tempo, a gente conseguiu superar, abrir o diálogo para poder superar a greve [dos professores], as escolas foram desocupadas de uma forma absolutamente pacífica, não houve intervenção militar em nenhuma das escolas, a gente fez todo o apoio por diálogo. Internamente, nós fizemos uma restruturação da secretaria. Dividimos a parte de gestão, focamos na gestão educacional das escolas, trouxemos o setor de obras para o nível de superintendência para ficar mais estratégico, e nisso a gente consegui imprimir um novo ritmo fazendo de início a rescisão do contrato das obras da Operação Rêmora para reprojetar. É possível verificar os status das obras em andamento para depois fazer a devolutiva e fazer um novo projeto, gestão e licitação. Ou seja, as obras devem ser retomadas em breve. As questões jurídicas são muito complicadas, mas em tempo bastante rápido a gente conseguiu fazer as rescisões, e colocamos o meio estratégico para andar. O planejamento, que envolveu o combate à corrupção na Sala de Transparência, no novo modo de se relacionar com os fornecedores, no sentido de que a gente fez uma sala de relações institucionais, em que um servidor designado pelo gabinete, junto com o fiscal do contrato, recebe um e-mail, pede a pauta, diz o número do contato e informa qual o objetivo da reunião. Ao mesmo tempo, importante momento foi a criação do Gabinete de Segurança orgânica, do que nós chamamos de adjuntos. Todos os órgãos de controle interno do Estado e da própria secretaria reunidos para discutir as obras travadas. A secretaria voltou a andar, voltou a caminhar ao final desse processo.

CMT: Houve mudança na gestão escolar?

MM: Em relação à própria educação e ao ensino, esses dez meses foram imprescindíveis para que a gente fizesse um grande planejamento estratégico que se transformou nas ações do Pró-Escolas. Ele não surgiria da cabeça de um secretário se não fosse buscar um compromisso do então candidato a governador Pedro Taques. Hoje, o Pró-Escolas está lá, onde o combate ao alfabetismo estava; as escolas integrais também estão lá. A gente dialogou com população e fez o planejamento estratégico, um planejamento muito intenso durante esse período. Parecia que a secretaria estava parada, quando na verdade ela estava se preparando para avançar o Pró-Escolas. Visitamos os 15 polos da educação com duas palestras por dia, um para a comunidade e outro na Câmara de Vereadores, ou em um lugar aberto que chamasse a sociedade civil, apresentando linhas mestras para poder ouvir as sugestões e as críticas. Através dos polos, nós alcançamos todos os municípios. Somente depois que andamos 10 mil km, 5 mil pessoas participando desse processo, 15 polos visitados com perspectiva de alcançar os 141 municípios é que a gente consolidou e apresentou o projeto Pró-Escolas.

CMT: Há planejamento para mudar o formato da educação escolar?

MM: Uma das políticas que nós vamos adotar é a criação de sistemas educacionais, que será uma coisa inédita no Brasil. É uma construção que vinha sendo trabalhada já há algum tempo, que significa o seguinte: a gente vai criar escolas vocacionadas para melhorar sua atratividade; já aliar a educação básica com uma atividade extra, atividade complementar, que esteja de acordo com as vocações de cada aluno. Uma proposta de projeto de vida para os estudantes na sua perspectiva de ser feliz existencialmente. A Arena da Educação é a primeira delas. Será ensino básico normal, mas ela tem uma carga horária mais forte de educação física. Tem investimento maior no esporte, a ideia é que a gente avance nas escolas normais com mais investimentos em tecnologia. Nós vamos também trabalhar em escolas de artes e dança para quem tem a vocação mais nas disciplinas humanísticas, teatro, música; vai à escola, aproveita a educação básica e naquele mesmo espaço desenvolve sua potencialidade. A ideia é que em cada macrorregião nós tenhamos oferta de cada um das vocações, e o estudante então não vai escolher escola só porque está próxima à casa dele, ele vai à escola também porque está próxima da vocação dele. Nós temos o diálogo com a Secretaria de Cultura para escola de danças e artes, e as escolas de tecnologia. Já estamos trabalhando esse planejamento no cinturão do bairro Pedra 90; lá nós estamos substituindo três escolas velhas por quatro escolas novas, e cada uma com uma vocação. Sendo dois modelos pelo Ciec (Centro integrado de escola de comunidade), que é escola mais robusta, com vocação para o tempo integral e que vai acolher a comunidade nessa estrutura.

CMT: O que será feito para melhorar os índices do ensino médio, que estão decaindo no Ideb?

MM: O Ideb é feito com dois indicadores, duas variáveis fundamentais. A primeira é a aprovação, chamamos isso de correção de fluxo. O fluxo está corrigido, os alunos não estão retidos ao longo dos anos que eles estudam. A segunda variável é o nível de conhecimento da Prova Brasil. Como nós temos um sistema de formação por ciclos no ensino fundamental, nós tiramos sempre algo próximo de 91.7, que seria uma nota no fluxo, isso disfarça o conhecimento, porque como o ciclo só vai fazer a retenção no nono ano, o aluno faz toda a progressão, nove anos, sem reprovação. O índice de retenção explode, em algumas escolas chega a 50%. A média da distorção da idade-série no Brasil e em Mato Grosso é de 36%. O que significa que a cada 100 mil alunos do ensino médio 36 mil estão fora de idade correta na sala de aula. Por isso cai tanto o nível de qualidade do ensino médio, que é quando começa a reprovar. O Ideb está mascarando pelo fluxo, ou seja, a galera está passando sem saber o que é dado em sala de aula.

CMT: Alguma coisa pode ser feita para mudar essa situação?

MM: A ideia é encontrar um sistema de equilíbrio para manter o fluxo bom, porque a retenção gera evasão escolar. O sistema de ciclos tem essa grande vantagem, que é segurar os estudantes na escola e ele tem mais oportunidade de aprendizado. Não adianta simplesmente reprovar todo mundo no fundamental, a ideia é manter um fluxo bom para que não haja a evasão escolar e melhorar o conhecimento. Então, a gente está fazendo várias políticas de apoio curricular, reforço curricular, principalmente nas linguagens. O que a gente tem proposto não é 8 nem 80. É a possibilidade de retenção no nono ano, no fim do ciclo. Não deixar passar para o primeiro ano do seriado, ensino médio, para identificar o problema, já segura no último ano do terceiro ciclo. Ele [o estudante] precisa saber que tem uma meta a cumprir, não vai passar pela inércia; se não cumprir, a gente dá o apoio. Vamos estudar para ver qual é o caso que precisa de apoio.

CMT: Como está a situação dos professores? Já há novamente a polêmica da RGA e da reforma da Previdência com possibilidade de greve.

MM: Temos escolas em Mato Grosso que estão há 37 anos esperando por reforma. Isso mostra uma construção histórica que não valorizou a educação, não valorizou o profissional da educação. A Secretaria de Educação e o governo têm atuado para reverter a injustiça histórica com relação à ambiência escolar, por isso o Pró-Escolas tem investimento para a estrutura escolar, são 140 obras previstas. E também em relação ao profissional da educação. Entendemos que o tratamento do profissional da educação tem que ser diferenciado neste momento histórico. Então, a educação não será atingida pelo congelamento na lei do teto de gastos e também temos indicadores que indicam que o servidor, em geral, manteve 96% do poder de compra. O que significa dizer que a reposição [salarial] que está ocorrendo, ainda que seja parcelada, tem suprido a necessidade em relação à inflação. A RGA agora vem menor, não são aqueles 11% [correção para 2016 da inflação de 2015]. O desespero era esse. De um dia para o outro a RGA sobe 5% (2015) para 11% de aumento direto, na veia. Ia atrasar salário. Era uma medida difícil, então é que aconteceu o que aconteceu: um desgaste [político entre servidores e o governo] muito forte. Mas era um remédio amargo que precisava ser tomado. Ser trabalhado, explicado. Muito pior que a RGA parcelada é o atraso salarial. O governo já determinou o aumento de 7,23% para os profissionais da educação, em maio, independente da RGA, a gente já vai mantendo a política que a legislação prevê. A média do Brasil de contrato é de 40 horas semanais na educação; a nossa é de 30. O piso nacional de salário é de R$ 2,2 mil; o nosso é de R$ 3,3 mil. Há uma política sim, os investimentos da educação cresceram muito em 2015 e 2016, e tiveram que crescer; se não crescesse, não seria possível pagar esses aumentos – fizemos aumento de 7,90% em 2015, 7,23% em 2016 e mais 7% em 2017.

CMT: E quando sai o concurso público?

MM: Era para ter saído em março, mas por problema burocráticos foi adiado, mas agora em abril vai sair. O governo já anunciou, então vai sair. São 5.748 vagas para profissionais da educação. Foi um acordo que fizemos com a categoria que vamos fazer concurso para todas as áreas, não só para professores.

CMT: Houve a polêmica das PPPs, logo que você assumiu. Como está a situação hoje?

MM: A gente fez o compromisso de que não colocaria o projeto em andamento sem fazer conferências na forma da legislação, de debate com o sindicato e toda a sociedade. O projeto avançou e gerou um projeto arquitetônico muito bonito que a gente transformou no Ciec (Centro Integrado Escola-Comunidade), mas está suspenso. No momento nós entendemos que há outras possibilidades de financiamento dessa rede [de 76 escolas]; enquanto entendermos ser possível avançar, nós vamos avançar nesse sentido.

CMT: Entrando um pouco na política: você entrou na Seduc num momento de polêmica com a saída do Permínio Pinto e as manifestações por causa da PPP. O que o Marco Marrafon teve que fazer para recuperar a imagem da Seduc?

MM: A retomada do diálogo com profissionais da educação, com a comunidade escolar, reestruturar o processo, reestruturar a secretaria, fazer mudança do quadro de pessoal. Estabelecimento de um programa de integridade, de ética muito forte para combater e, o mais importante, prevenir a corrupção. Nesse tempo de gestão, então foi o combate à corrupção e planejamento estratégico do Pró-Escolas. Quatorze escolas integrantes já estão em funcionamento, e já vai ser inaugurada mais uma. Das 35 escolas anunciadas no Pró-Escolas, já foram entregues oito. A Seduc volta a se movimentar e a entregar [obras]. Primeiro faz, depois apresenta.

CMT: Sindicatos afirmam que há muito dinheiro gasto com corrupção que poderia ser aplicado na área da educação. Como você vê isso?

MM: Não é verdade que tem muito dinheiro sendo gasto com corrupção e isso atrapalha o orçamento. As coisas precisam ser demonstradas. No nosso governo de transformação o que temos trabalhado muito é isto: mudar a forma gestão reestruturando o processo para que as coisas andem independente do secretário, ou seja, para depois ter que dar uma ‘empurradinha’, arranjar dificuldade para vender facilidade.  Temos que fazer isso aqui na secretaria diariamente, como controlar GPS de carros da secretaria para saber para onde está indo, para a rota que estamos fazendo, eu tenho um sistema de monitoramento de gestão em que eu tenho prazo de um dia para o servidor liberar o documento; se não liberou, o que está acontecendo? Se aparece alguma denúncia, a gente faz apuração e se tiver algum indício de verossimilhança, muito rapidamente damos um tratamento, temos exoneração, abertura de processo administrativo, enfim.

CMT: Você acredita que está inaugurando uma nova época na Seduc?

MM: A gente trabalhou muito a transformação que precisa ser feita nos processos, na estrutura, nas pessoas, na motivação da equipe, na política contra a corrupção, e essa transformação começou a gerar efeitos. Temos obras que têm vindo com mais qualidade, os orçamentos estão sendo bem feitos, se a gente detecta alguma inconformidade na licitação, rapidamente suspendemos o edital. Eu acredito que tem uma nova era no Brasil e a Seduc está nesse movimento. E essa nova era exige um trato transparente, compromissado com os maiores princípios republicanos e, acima de tudo, um cuidado redobrado com os recursos públicos. Vendo os ventos da Lava Jato, o Brasil vai entrar nos eixos ou vamos ter uma convulsão social.

Reinaldo Fernandes

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