A polêmica sobre a validade de cartas de crédito emitidas pelo governo estadual nos últimos anos pode encerrar com prejuízos para o Estado. Hoje, parte dos R$ 600 milhões emitidos a beneficiários está sob o risco de ficar sem validade alguma por entrave judicial do Ministério Público do Estado (MPE) e, caso seja decidido que os documentos não têm valor, empresários que adquiriram a carta podem quebrar e o Estado arcar com dívida próxima a R$ 4 bilhões.
A avaliação é o advogado Thiago Dayan da Luz Barros, especialista em direito constitucional. Segundo ele, ação civil pública ingressada pelo Ministério Público alega que houve fraude na formulação de cartas emitidas, com valor a mais do que os beneficiários deveriam receber.
“O contribuinte que comprou essas certidões para compensação de dívidas junto ao Estado poderá ter seu processo indeferido e sua dívida que era do valor ‘y’ na data do protocolo será corrigida até hoje, subindo várias vezes”, explica Thiago Barros.
Conforme o MPE, as fraudes ocorreram entre 2008 e 2010, período em que R$ 418,4 milhões teriam sido desviados dos cofres públicos. O Ministério Público aponta que o esquema envolvia o ex-secretário de Fazenda Éder Moraes, o deputado Gilmar Fabris e outras 15 pessoas que foram denunciadas em junho do ano passado por formação de quadrilha.
No entanto, segundo o advogado Thiago Dayan da Luz Barros, a própria Procuradoria Geral do Estado (PGE) emitira parecer sobre a emissão de R$ 600 milhões em cartas de crédito, pois o valor global da dívida subiria para R$ 1 bilhão caso a dívida fosse assumida por meio de outro tipo de quitação – a quantia vale para cálculo de correção dos valores até 2009.
“Se houver decisão definitiva cancelando os créditos, o Estado vai falir. Vai deixar de arrecadar o ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços) das empresas quebradas e vai perder dinheiro para se defender das ações pedindo restituições, indenizações, danos morais”, pontua o advogado.
Suspensão de procedimento rompe hierarquia do TJ
O especialista Thiago Dayan da Luz Barros afirma que a ação civil pública iniciada pelo Ministério Público do Estado contradiz decisão julgada em 2011 do Tribunal de Justiça, que considerou como infringência do princípio de segurança jurídica para as cartas de crédito, visto que já havia à época documentos distribuídos pelo Estado.
Ele cita ainda decisão do juiz Luís Aparecido Bertolucci Júnior, de 2015, que suspendeu todo procedimento de compensação. Segundo o especialista, esse julgamento fere a hierarquia de instâncias judiciais.
“Um juiz de primeiro grau suspende todos os procedimentos de compensação convalidados pelo Tribunal de Justiça. Com isso, não entendo o que é hierarquia das decisões, já que ficaram evidentes as razões da segurança jurídica”, afirma.
Dayan afirma que grande parte dos beneficiários de cartas de crédito já repassou suas cartas a empresários, que fizeram aquisição como garantia de quitação de dívidas fiscais.
Em agosto do ano passado, o desembargador Orlando Perri se manifestara contra a ação do Ministério Público, iniciada em 2014, por “equívoco” na análise dos documentos que servem de base para a ação civil pública.
“A ação penal proposta pelo Ministério Público baseia-se em um parecer emitido pela Controladoria Geral do Estado e que todas as outras perícias já realizadas mostraram o seu equívoco”, disse Perri.