A Polícia Militar do Rio realiza na próxima semana as provas para a escolha dos 50 novos oficiais da corporação, num concurso com regras diferentes das planejadas nos últimos dois anos. O novo edital, divulgado em 20 de dezembro passado, vem recebendo críticas por limitar o acesso de mulheres ao oficialato e exigir dos candidatos formação em direito. Apenas, cinco vagas, ou seja, 10% do total, estão destinadas ao sexo feminino.
O edital para novos oficiais no Rio, divulgado em dezembro, atraiu críticas de quem trabalhava com o planejamento anterior da PM. Além de queixas sobre as poucas vagas destinadas as mulheres, há também reclamações pela nova exigência do diploma de Direito aos candidatos. "A polícia ainda é uma instituição muito machista. Por trás disso, me parece um projeto elitista que isola os praças, impedindo que soldados, cabos e sargentos possam atingir o topo da carreira", critica o coronel Robson Rodrigues, ex-chefe do Estado Maior da corporação e um dos responsáveis por elaborar o projeto anterior para novos oficiais da PM.
Em 2015, a Polícia Militar do Rio lançou um projeto para ampliar a capacitação e que poderia também resultar em mais candidatos a oficiais. Na ocasião, havia um projeto para que, em 15 anos, todos os soldados da corporação tivessem curso superior no currículo. A corporação iniciou então, na época, em parceria com a Universidade Federal Fluminense (UFF), um curso superior de tecnólogo em Segurança Pública. Os praças que cursassem as disciplinas poderiam ainda se inscrever para a prova de oficiais, o que possibilitaria a uma ascensão na carreira.
Formados apenas em curso fruto de parceria ficam de fora
Em pouco mais de dois anos, 3.000 alunos passaram pelo curso, sendo 80% deles da Polícia Militar. A primeira turma formou 80 alunos. Agora, em março, outros 250 serão formados. A nova gestão da PM do Rio decidiu que apenas formados em direito podem fazer a prova para oficiais. De nada valeu o curso da UFF. Os alunos reclamam a decisão por deixá-los de fora da prova, mas não dão entrevistas por serem proibidos pela corporação.
"A proposta do atual concurso frusta aqueles profissionais que tentavam evoluir na carreira. Além disso, quem disse que o Direito é a disciplina adequada? Isso é agir na contramão do pensamento, já que o policial precisa estar próximo do público e ter uma visão geral para atender a população", afirma o professor Lenin Pires, antropólogo e professor do Curso de Tecnólogo em Segurança Pública. Pires foi escolhido como professor homenageado pela primeira turma de Tecnólogos em Segurança Pública.
"Isso (o concurso) é um retrocesso. O pior é que me parece um projeto corporativista e de alguns setores do oficialato, que não conversa com a sociedade, tampouco com uma grande parcela das praças que se interessou em buscar o aperfeiçoamento profissional", comenta o coronel Robson Rodrigues. Segundo ele, a escolha pelo Direito "não vai aperfeiçoar o trabalho policial".
"É produzir o distanciamento que há na Polícia Civil. Me parece uma disputa desnecessária que não contribui com a modernização da polícia e tampouco com interesse social. Em suma, essa ação é isolada e anacrônica, desconectada, portanto, do plano mais amplo que previa, inclusive, uma alteração da carreira policial militar no estado, com a flexibilização das estruturas militares", opina o coronel, também formado em Direito.
Os candidatos às vagas de oficiais da PM do Rio devem ter entre 18 e 34 anos. A inscrição foi de R$ 112, preço superior ao médio adotado por outros concursos, como o do Tribunal Regional Federal do Rio e Espírito Santo, que custou R$ 70.
PM diz que Direito é necessário
O comandante Rodrigo Vianna, da PM, explica que o curso de Direito é necessário para o trabalho do policial.
“Esse curso visa formar tenentes e capitães. Eles funcionam como autoridades de polícia judiciária militar. Eles participam de julgamentos e processos em que o Direito é uma ferramenta fundamental, um instrumental muito importante para um desempenho melhor das funções. Ganha a sociedade quando passamos a pedir o bacharelado em Direito para esse candidato. Estamos estudando a possibilidade de, no futuro, como parte do concurso, como prova de títulos, aceitar o curso superior tecnológico de segurança pública devido a sua afinidade com a área. Ou seja, não há impedimento nenhum de que, no futuro, esse curso seja aproveitado. E quem possui esse curso, mas possui bacharelado em Direito, está convidado a realizar a prova”, explicou o PM.
Ele explica a restrição à presença feminina:
“Nós temos dois aspectos que precisamos analisar: o legal e técnico. No aspecto legal, a Procuradoria Geral do Estado do RJ, responsável pela aprovação dos editais, tendo em vista os exames de educação física para homens e mulheres são distintos, de que deveria haver a delimitação de vagas para as mulheres. No campo de vista técnico, tento em vista que mais de 90% dos nossos presos e abordados são do sexo masculino, a legislação processual penal fala para evitar ao máximo que a revista em mulheres seja feita por homens e também o oposto. Estamos adequando esse percentual à realidade encontrada”, contou o militar.
Polícia Federal já não tem limitador por sexo
O limite vai na contramão da tendência de possibilitar que as mulheres tenham mais acesso à carreiras no serviço público no País. Na Polícia Federal, por exemplo, já não há limitador no número de vagas. Se classifica quem obtiver a maior nota, independente de ser homem ou mulher. Além disso, tramita na Câmara Federal um projeto que reserva ao sexo feminino, 25% das vagas em concursos na área de segurança pública. Em dezembro, o projeto passou pela Comissão de Defesa dos Direitos da Mulher.
Pesquisa sobre o perfil das instituições feita pelo Fórum Nacional de Segurança Pública mostra que as mulheres ocupam 20% do efetivo nacional das forças de segurança. Nas Polícias militares, elas são, em média, 7,2% do efetivo. No Corpo de Bombeiros está em 7,9%.
Rio de Janeiro