Circuito Entrevista

“30 mil pessoas foram detidas em 10 meses”, destaca secretário

Fotos: Ahmad Jarrah / Circuito MT

Um brasiliense a serviço da lei em Mato Grosso. Assim podemos definir Mauro Zaque de Jesus, atual Secretário de Estado de Segurança Pública da gestão Pedro Taques (PSDB). Natural do Distrito Federal, “mas criado aqui”, como destaca, é bacharel em Direito pela Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) e possui um vasto currículo que chamou a atenção do governador, entre os quais destacam-se cursos realizados no Federal Bureau of Investigation (FBI), tática antissequestro pela SWAT de Orlando e investigação de Lavagem de Dinheiro pela Law Enforcement Academy (ILEA), todos nos Estados Unidos.

Promotor do Ministério Público Estadual (MPE-MT), Zaque também frequentou cursos na Agência Brasileira de Inteligência (ABIN) e coordenou durante três anos o Grupo Nacional de Combate às Organizações Criminosas (GNCOC), que integra o Conselho Nacional de Procuradores-Gerais (CNPG), formado por membros dos Ministérios Públicos Estaduais e da União.

Em entrevista exclusiva ao Circuito Mato Grosso, Zaque falou um pouco das políticas públicas e os resultados alcançados nesses 10 meses de gestão, e criticou os jornalistas e o veículo de comunicação do caso do “pó de gesso”. 

Circuito Mato Grosso: Segundo uma recente pesquisa do Ministério da Justiça, Mato Grosso é o quarto Estado brasileiro em número de homicídios. Como a secretaria encara esse dado?

Mauro Zaque de Jesus: Esse dado pode ser encarado de forma muito simples. Esses números se referem a 2014, e fomos nós mesmos que passamos essas informações em janeiro de 2015. Infelizmente esse quadro reflete o abandono e o caos da segurança pública em relação aos anos sem investimentos, estrutura, efetivo etc. Esse tipo de realidade faz a segurança pública ser ruim em qualquer lugar do mundo. Os dados são verdadeiros, mas não são novidade, em razão do cenário que tínhamos em termos de segurança pública. Essa é a triste realidade.

Circuito: A violência não pode ser combatida apenas com ações da Secretaria de Segurança Pública. Quais políticas são desenvolvidas com outras pastas do governo?

Zaque: A segurança pública precisa ser vista pela ótica da interdisciplinaridade. Segurança pública não se resume a polícia, e, sim, a uma série de políticas de segurança pública com projetos que restem complexos e eficazes. Existem, sim, ações interdisciplinares. Mas neste ano de 2015, em razão do problema de 2014, que foi considerado o ano mais violento da história de Mato Grosso, tivemos que focar as ações de segurança na repressão. Tivemos que dar um choque na segurança. Estamos em Outubro de 2015, sabe quantas pessoas a estrutura da segurança pública conduziu detida esse ano? Aproximadamente 30 mil. Estamos trabalhando. A operação Top Five, por exemplo, tinha uma programação para durar 50 dias. Só nessa operação prendemos 2325 pessoas. Apenas no interior foram 882 lideranças negativas. O nosso foco era atuar no viés repressivo, mas a partir do próximo ano atuaremos no viés repressivo e preventivo. O governador já está criando uma nova secretaria adjunta, de ações preventivas. Ela pensará tão somente na prevenção para que possamos trabalhar nas duas frentes de forma simultânea. 

Circuito: Mato Grosso possui um dos principais corredores para o tráfico de drogas . Quais as políticas públicas para atender essa demanda?

Zaque: Só neste ano são 3200 homens a mais na estrutura de segurança pública, pela primeira vez na história do governo do Mato Grosso. De 2004 a 2014 o Estado colocou 80 soldados no corpo de bombeiros. Só em 2015 o governo está colocando 450 novos homens, mais de 2000 homens na polícia militar, mais de 1000 homens na polícia civil. Mas colocamos reforço na fronteira, e a partir do início do próximo ano colocaremos mais 40 homens no GEFRON, com veículos e armamentos. Essa é uma frente. Também já partimos para desmantelamento das bocas de fumo. Foram mais de200 bocas de fumo fechadas dentro do Estado. Não adianta apreendermos grandes carregamentos de drogas e deixar as bocas funcionarem. Até junho apreendemos mais entorpecentes que o ano passado inteiro. É uma briga de gato e rato. Precisamos fechar a fronteira, desenvolver um trabalho forte de repressão aos pontos de vendas de drogas, desenvolver um trabalho forte de inteligência e para isso estamos quase triplicando o número de agentes da delegacia de repressão a entorpecentes de Cuiabá. Vamos atuar no âmbito preventivo fortalecendo a rede cidadã, projeto que atende diretamente as escolas, onde evitaremos que os jovens tornem-se dependentes químicos.

Circuito: Como o senhor encara a ação dos jornalistas que tentaram “provar” a ineficiência do Grupo Especial de Fronteira (Gefron)? A secretaria foi informada?

Zaque: Foi uma ação infeliz. A imprensa pode e deve colaborar com a segurança pública sem que para isso tenha que produzir ou vender o caos, para que depois possa vender esse caos nessa ou naquela matéria. Os fatos falam por si. Eles entraram para simular o tráfico e foram presos. Até hoje os veículos da emissora estão detidos em Cáceres. Foi instaurado um inquérito policial federal para apurar os fatos. Eu acho que foi uma ação infeliz, temos outras pautas que poderíamos trabalhar, defendo o trabalho da imprensa livre, ela tem liberdade para trabalhar. Mas poderíamos ter levado essa equipe para a fronteira, mostrar o quanto nossos policiais trabalham e se dedicam. Não quero chamar para o Estado a responsabilidade da fronteira, que é federal. Mas se o governo federal não tem responsabilidade, nós temos. O governador de Mato Grosso já disse que não irá deixar ninguém para trás. Iremos proteger o cidadão, é nossa obrigação. Ainda que a SESP fosse avisada, como vamos saber que dia vai passar, qual o carro e horário? O dispositivo estava funcionando normalmente, 24 horas por dia, 7 dias por semana. É uma página triste da história da mídia. Estamos prontos para trabalhar com qualquer emissora. Mas precisamos unir esforços para proteger os interesses da sociedade. Essa é missão da segurança pública e da mídia, que deve deixar de lado interesses particulares, financeiros e institucionais, tanto pelo lado da segurança como da mídia. Temos que nos unir para proteger nossa população. Também não podemos deixar de considerar que em razão dessa simulação, tiramos da fronteira por uma madrugada inteira três equipes do Gefron, dezesseis homens, uma equipe com 5 homens da polícia federal, delegado e peritos. Houve toda uma mobilização do efetivo que deveria guardar o sono do cidadão de bem para atender uma simulação. O caminho não é esse para que possamos ter uma segurança pública de qualidade. 

Circuito: A segunda fase da operação Sodoma está em andamento. Alguns grupos apontam uma suposta vitimização dos delatores, como se eles também não fossem criminosos. Como o senhor encara essa questão? 

Zaque: Em primeiro lugar não podemos tratá-los como delatores. É uma colaboração premiada. Ninguém está livre do erro. Ninguém que vaga por esse plano terrestre está livre do erro. Mas ninguém é obrigado também a permanecer no erro. É uma forma de reparar o erro que se praticou. A justiça enxerga isso com bons olhos. Não são vítimas. Entendo que são pessoas atendendo a interesses processuais e jurídicos, abandonam o erro e colaboram com a justiça. Isso é ético e moralmente aceito. O que enxergo é que existe um movimento, de pessoas que devem, de pessoas que cometeram erros e que são contra esse tipo de colaboração, por interesses pessoais, pois essas colaborações atrapalham os interesses de quem deve. Qualquer um pode, sim, buscar e reparar seus erros. Você não pode alterar o passado, mas pode mudar o futuro com uma nova postura. É um instrumento legal importantíssimo de cidadania, de combate à corrupção, e que não deve ser atacado por aqueles que o fazem em benefício próprio.

Circuito: A secretaria vem realizando patrulhamento aéreo ostensivo para coibir ações de criminosos. Este tipo de ação não é mais dispendioso para o Estado na comparação com o patrulhamento terrestre? 

Zaque: Precisamos traçar alguns princípios. A segurança pública não é um custo e sim um investimento para a qualidade de vida e bem-estar das pessoas. Temos que considerar o seguinte: Mato Grosso tem entre 40% e 50% do efetivo da polícia militar que seria aceitável para a gente rodar a segurança pública de Mato Grosso. Não tenho policiais suficientes para rodar no terreno, fazer segurança pública minimamente satisfatória. Se eu tivesse mais 4 mil policiais eu os colocaria nas áreas quentes da criminalidade para diminuir os índices. Chamamos 2 mil homens que é o que poderíamos fazer. É insuficiente. O patrulhamento aéreo, por si só, inibe a ação criminosa. Qualquer um que tente fazer alguma ação ali ficará intimidado porque ele sabe que não conseguirá fugir do helicóptero. Temos três helicópteros e seria inadmissível não utilizá-los, deixá-los parados no hangar. Se não fosse o patrulhamento aéreo, os números seriam alarmantes, e após esse patrulhamento aéreo os números da criminalidade caíram drasticamente. 

Circuito: A fazenda "Asa Branca" foi leiloada na terça-feira (20). Há previsão de investimento do valor conseguido?

Zaque: Temos algumas ações, isso não está definido, mas a princípio, a depender de estudos, estamos pensando em construir um centro integrado de formação policial, de padrão internacional, com o que há de melhor no mundo para que nosso policial tenha a melhor formação possível. Se não investirmos no nosso policial, não teremos uma mão de obra qualificada para exercermos um trabalho de importância estratégica como a segurança pública. Vamos fazer um negócio top. Qualquer americano ou europeu que vier aqui vai se sentir em casa com esse novo centro. A fazenda Asa Branca foi a primeira de muitas. Em breve acredito que teremos outra. 

Circuito: Há previsão de construção de outras delegacias da mulher.

Zaque: Há previsão, mas o que nos impede de criar outras delegacias da mulher é a falta de efetivo. Infelizmente vivemos num país em que alguns homens ainda agridem mulheres. Essa é uma questão séria, de interesse do Estado. Mas precisamos arrumar a casa. Fechamos no mês passado o plano de gestão da segurança pública. A população precisa entender que não chegamos nessa situação do dia para a noite e não sairemos dela do dia para a noite. 

Circuito: A OAB apontou alguns abusos na prisão do advogado pela operação metástase…

Zaque: Não posso me manifestar pois desconheço a ação da OAB e a existência de abusos. Confio nas ações do GAECO, sou suspeito para falar, pois coordenei o GAECO, são capacitados e conhecedores da lei. São policias e promotores altamente qualificados. Mas não tenho conhecimento disso, então me abstenho a fazer um comentário de maneira mais aprofundada.

Circuito: O Estado pretende tomar alguma ação específica em relação ao garimpo de Pontes e Lacerda?

Zaque: Estamos aguardando ainda o posicionamento dos órgãos federais para saber que medidas podem ser tomadas. As informações de inteligência que possuímos é que o garimpo já está fraquejando, hoje ele teria só 40% do número de pessoas que havia na semana passada. Não sabemos nem se esse garimpo irá prosperar. Mas estamos prontos para fazer um trabalho integrado com os órgãos federais para dar todo tipo de suporte necessário. 

Circuito: Não são raros os casos de abuso de autoridade cometidos por policiais. Você considera a formação deles deficiente?

Zaque: Não podemos pensar numa tropa de aproximadamente 13 mil homens, entre polícia militar, civil, politec etc que não tenha problemas. Isso aplicamos para qualquer área da sociedade. Agora, dizer que isso é uma regra, não concordo. Investir na capacitação do policial é estratégico para qualquer estrutura de segurança pública, e nós não somos diferentes. Capacitar, treinar, qualificar isso é sempre importante. Eventuais casos de abuso são isolados e punidos por meio das corregedorias e do Ministério Público. Os casos não ficam abertos sem qualquer resposta do Estado.

Circuito: Alguns criminosos tentaram explodir um caixa eletrônico na Univag há algumas semanas. O “novo cangaço” pode ter voltado?

Zaque: Não há nenhum indício dessa volta. Nesse ano essas ações não chegaram a três ou quatro casos. No passado já foi altíssimo. Não podemos ter a pretensão de zerar qualquer atividade criminosa. Graças à intervenção rápida e oportuna da polícia, eles não conseguiram explodir esse caixa na faculdade. É utopia pensar que seria possível zerar um índice de criminalidade. 

Circuito: Há previsão de concurso público?

Zaque: Há previsão. No início de 2015, cientes de toda a dificuldade de efetivo, criamos uma comissão de estudos de recomposição para que daqui a cinco, dez ou quinze anos o Estado não tenha que passar por uma situação tão difícil como enfrentamos hoje. Teremos concurso sim, pois temos que recompor esse efetivo ano a ano, teremos um concurso para 130 delegados de polícia, e também para a polícia civil. A ideia é recompor esse efetivo em sua plenitude.

Confira detalhes da reportagem do Circuito Mato Grosso

Diego Fredericci

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