Eles conseguiram ainda retirar exemplares de circulação com alegações de que as cópias eram defeituosas.
"Devo admitir que tenho uma sensação dúbia sobre o livro. Esse ataque que sofri de um grupo de fanáticos foi uma das coisas mais dolorosas por que já passei", diz Sullivan, ex-editor da revista "Rolling Stone", por telefone.
"O pior é que as pessoas nem leram o livro e o atacaram citando coisas que eu não escrevi, baseando-se no que ouviram falar."
Segundo o autor, a campanha afetou as vendas –ele não cita o total de exemplares vendidos, mas diz que, apesar de a editora ter lucrado com o livro, "não foi nem de longe o que esperava". As críticas da imprensa estrangeira à obra foram mistas.
Ameaçãs familiares
A família de Jackson, retratada de forma bastante crítica, ameaçou com diversos processos, mas o jornalista diz que a editora não cedeu "porque sabia que eu podia defender o que tinha escrito".
A biografia, que sai no Brasil com uma tiragem relativamente alta (12 mil exemplares), é um grande trabalho de compilação de informações já publicadas sobre o cantor.
Iniciada após a sua morte, como uma reportagem para a revista "Rolling Stone", a obra progrediu para uma narrativa de quase 900 páginas –129 delas de referências bibliográficas, mais 32 de fotos. É dividida em quatro partes, de forma não cronológica.
Como não entrevistou Jackson nem conseguiu acesso direto a personagens importantes de sua vida –o único familiar com quem falou foi a matriarca, Katherine–, Sullivan investiu mais nos últimos cinco anos de vida do astro e na disputa por seu espólio, depois da morte.
O livro mostra ainda a gradual destruição da reputação e da saúde (inclusive a financeira) do artista entre 1993 e 2005, quando sofreu duas acusações públicas de abuso sexual de crianças –a primeira, resolvida com um acordo extrajudicial, a segunda, nos tribunais (ele foi inocentado).
Há um apanhado dos primeiros 35 anos de vida de Jackson, da infância traumática à transformação em "rei do pop", e exemplos de seu comportamento exótico, que passou a atrair mais atenção do que sua música.
Trechos do livro "Intocável"
O dr. Mark Sinnreich se lembra da primeira visita de Michael ao cirurgião ortopédico em seu consultório na Flórida, em 2002: "Eu pedi para ele tirar a máscara […]. Parecia que tinha dois buracos. Nenhum nariz". Michael teve de se virar com próteses.
Ele as mantinha em seu closet em Neverland, um grande jarro de narizes falsos –de várias formas e tamanhos– cercado por tubos de cola. "Ele me disse que eram para disfarces", recorda Adrian McManus, uma de suas funcionárias no rancho Neverland.
Mas a única coisa que Michael estava disfarçando àquela altura era o resultado de, no mínimo, seis plásticas nasais: duas narinas cercadas por uma camada de cartilagem enrugada, murcha e descolorida. Ele era um maquiador habilidoso desde a adolescência, e em 15 minutos na frente de um espelho conseguia criar uma aparência capaz de enganar a maior parte das pessoas.
Cirurgiões plásticos especulavam desde 1990 na televisão se a ponta de seu nariz havia sido substituída por uma prótese de osso ou plástico. Em 2001, no entanto, as mudanças pelas quais seu nariz passava de ano em ano –às vezes de semana em semana– entregaram o jogo. (pág. 264)
Rose Marie era o nome dela, lembrou Michael, que, com sete anos, observava-a fascinado girar os enfeites presos a seus mamilos, avançando na direção dos homens que tentavam agarrá-la… (pág. 69)
Folha de São Paulo